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Monica e Tatiane: até quando mulheres vão cair de edifícios?

Saiu no site UNIVERSA:

 

Veja publicação original: Monica e Tatiane: até quando mulheres vão cair de edifícios?

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Por Nina Lemos

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Quando eu tinha 14 anos, meu pai me chamou para uma conversa séria e disse: “Tome cuidado, você vai começar a sair, não vá para casa de desconhecido, cuidado com esses caras.” Ele estava, como todos os pais do Brasil, chocado com o caso de Mônica Granuzzo, uma menina da minha idade que “caiu de uma janela” enquanto, segundo as investigações, tentava escapar de um estupro.

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Os suspeitos eram jovens descolados. Eles se conheceram na boate Mamão com Açúcar, um clássico que quem viveu os anos 1980 no Rio de Janeiro deve lembrar. O principal envolvido no caso, o modelo  Ricardo Peixoto Sampaio, foi condenado a 20 anos de prisão. Cumpriu 1/3 da pena e está livre.

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O caso de Mônica, acontecido em 1985, foi um trauma para a minha geração. Lembrei de novo da história ao ver os vídeos terríveis que antecederam a morte de Tatiane Spitzner. A advogada morreu dia 22 de julho e as terríveis imagens da agressão sofrida pelo marido foram divulgadas sexta-feira passada no Jornal Nacional. As cenas mostram o marido da vítima, Luis Felipe Manvailer, a agredindo na garagem, no elevador. E, por fim, um corpo caindo. Luis Felipe é acusado de assassinato. A defesa dele diz que ela se “jogou”.

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Moças feito passarinho, avoando de edifícios

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É assustador pensar que eu tinha só 14 anos quando soube que nós, mulheres, tínhamos que tomar cuidado para não sermos jogadas pela janela. Ou levadas a pular, desesperadas. E chocante notar que pouca coisa mudou nesse sentido em 30 anos. Ainda há “moças feito passarinho, avoando de edifícios”, como cantou Chico Buarque em “Paratodos”. Sensação que dá: medo e pavor.

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Nos anos 1900, não existia nem a palavra feminicídio, isso muito menos era lei. Também não existia Delegacia da Mulher, conversas sobre relacionamentos abusivos, não tínhamos acesso a tantos coletivos feministas (e, sim, esses coletivos podem salvar vidas, e salvam). Mas, mesmo assim, continuamos caindo de edifícios.

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Repito aqui a história de Tatiane, por mais dolorosa que ela possa ser, porque ela precisa ser lembrada.

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Importante: na maioria dos casos, a dor da gente “não sai no jornal”. Não ficamos nem sabendo da maioria dos crimes, principalmente quando essas mulheres são negras e pobres (vamos ser realistas). Os números mostram: 65,3% das mulheres assassinadas no Brasil são negras, segundo dados do Mapa de Violência do Ipea de 2015.

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Mais dados importantes: em 2013, 13 mulheres morreram todos os dias no Brasil vítimas de femicídio. Cerca de 30% foram mortas por seus parceiros. A cada 7,2 segundos uma mulher é vítima de violência física no Brasil.

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Daí, dá para ter a noção de quantos casos acontecem sem que a gente fique sabendo. E do quanto os números são assustadores.

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Espero que os casos famosos sirvam de alerta contra todos os outros. E, quando penso nisso, fico feliz por não ter uma filha (principalmente, no Brasil) e ter que conversar com ela sobre tudo isso. Assim como ouvi quando tinha apenas 14 anos… E, pior, meu pai estava certo de ter essa conversa. Tristeza.

 

 

 

 

 

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