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A vendedora Raquel Ninô Curi Kachan, de 44 anos, não esquece a data em que o ex-marido a agrediu pela primeira vez na frente do filho de um ano, em 16 de dezembro de 2017.
Cinco meses depois, ela seria vítima de uma tentativa de femínicidio. Raquel sobreviveu às seis facadas e hoje tenta salvar outras mulheres que vivem relacionamentos abusivos.
“Se estou aqui viva na minha casa, com meu filho, é porque tenho uma missão de impedir que outras mulheres não passem pelo que passei e, talvez, não tenham a sorte de sobreviver como eu tive. Não aceitem menos do que vocês merecem. Eles fazem uma manipulação psicológica para que nós fiquemos culpadas”, diz.
Ela conheceu o ex-marido em janeiro de 2014, quando eram vizinhos. Quando se conheceram, logo começaram a morar juntos e dividir a mesma quitinete.
Raquel conta que, nos primeiros dois anos, o relacionamento foi “maravilhoso”. O ex se encaixava na categoria de “marido perfeito” e, juntos, planejaram o primeiro filho.
“Quando estava grávida de oito meses, ele chegou do primeiro trabalho e não me ouviu, foi conversar com o vizinho, tomou umas três latinhas de cerveja e foi trabalhar na ronda noturna, que era das 22h às 2h. Falei para ele não ir, porque não tinha descansado. Resultado: sofreu um acidente”.
Ele teve o joelho quebrado em três lugares. Consequentemente, ficou sem trabalhar nos dois empregos.

Quando acordei só vi uma luz branca, pensei: ‘pronto, morri’. Quando minha ex-sogra falou comigo, achei que ela tinha morrido também, porque ela estava enfartando
Na época, Raquel estava grávida de oito meses. Sem renda, eles aceitaram um convite do pai do ex-marido para morarem em Araputanga (a 242 km de Cuiabá), onde ele trabalharia em um caminhão boiadeiro.
Ela lembra que foi a partir daí que o marido deu sinais de violência e que os episódios de agressão começaram.
“Recebia de R$ 150 a R$ 200 e eu vendo aquela situação, com uma criança de seis meses, não tinha como. Fui trabalhar. Arrumei emprego de vendedora e começaram os problemas. Ele começou a ficar enciumado porque eu estava ganhando mais que ele, colocando comida em casa e pagando as contas”.
Além do emprego de vendedora, Raquel logo começou a trabalhar também com consultora da Avon e da Hinode.
Em 16 de dezembro de 2017, ela saiu para encontrar duas amigas do trabalho, na expectativa de cadastrá-las também como consultoras de vendas.
No entanto, o ex-marido não gostou de saber que Raquel iria sair de casa. Naquela noite, quando ela voltou para a residência que ficava no mesmo terreno onde moravam os ex-sogros, ela foi espancada e estrangulada pela primeira vez.
“Minha sorte foi que meu filho começou a gritar e meus sogros desceram. Quando o pai dele gritou, meu ex-marido se distraiu e eu consegui dar um soco no nariz dele e sair. Na hora meu olho inchou, não conseguia nem abrir”.
Raquel decidiu não denunciar a agressão e continuou no relacionamento sob a promessa de que o ex-marido não cometeria novas agressões.
“Ele me pedia perdão, trazia na comida na cama, porque eu não conseguia nem levantar. Meu corpo estava todo doído e machucado. Estava com três costelas quebradas, por sorte ele não quebrou o osso do meu rosto. Foi um anjo por cinco meses”.
Ciúmes e possessividade
Raquel conta que perdeu todos os empregos que conseguia por causa do marido, que ligava dezenas de vezes durante o expediente para checar onde ela estava. Em março de 2018, o marido estava bêbado e deu uma “rasteira” nela em frente a uma vizinha.
“Estava conversando, mostrando os produtos em uma revista da Avon. Ele me deu uma rasteira e disse: ‘Se você não entrar agora, vai dormir na rua’. Eu entrei, ele viu que estava com o celular na mão, jogou na parede e me estrangulou”.
Era o segundo aparelho de celular de Raquel quebrado pelo ex-marido. Naquela noite, ela dormiu novamente na casa dos sogros com o filho.
“O pai dele já estava inconformado, perguntava até quando ele me trataria daquele jeito. Eu gostava de me arrumar e me maquiar, tinha maleta de maquiagem. Sempre fui dedicada à casa e à família. Ele dizia que não iria me elogiar para não massagear o meu ego”.
Um mês depois, o ex-marido a agrediu novamente depois de beber pinga. Dessa vez, Raquel não pensou duas vezes antes de denunciá-lo.
“Me deu um tapa na cara, corri para o banheiro e chamei a Polícia. Ele ficou três dias preso. Conversei com o pai dele e disse que não dava mais. Reencontrei uma tia do Rio de Janeiro, em quem eu podia confiar. Ela disse que me ajudaria a sair de lá”.
No entanto, uma cirurgia de laqueadura atrasou a mudança e ela continuou morando com os ex-sogros enquanto se recuperava