HOME

Home

#MeToo: Elas denunciaram seus assediadores na China e estão sendo processadas por isso

Saiu no site O GLOBO

 

Veja publicação no site original:   #MeToo: Elas denunciaram seus assediadores na China e estão sendo processadas por isso

.

Um número crescente de homens na China está usando processos por difamação para combater alegações de assédio sexual. As mulheres estão pensando duas vezes em falar.

.

Por Sui-Lee Wee and Li Yuan

.

Em uma pequena sala de audiências em Pequim, os apoiadores de Wang Qi se reuniram, aguardando o início do primeiro julgamento envolvendo o movimento #MeToo na China. Wang acusou seu ex-chefe de assediá-la sexualmente. Mas não era o ex-chefe de Wang que estava sendo julgado. Era a própria Wang.

.

Zhou Fei, um alto funcionário da filial do Fundo Mundial para a Vida Selvagem na China, processou Wang em agosto de 2018, acusando a ex-funcionária de difamação por ela ter publicado um texto em uma rede social afirmando que ele a beijou à força durante uma viagem de trabalho.

.

“Se alguém não fizer um sacrifício pela proteção dos direitos e interesses das mulheres definitivamente não haverá progresso”, disse Wang no ano passado, antes de seu advogado a alertar que, se continuasse falando, poderia sofrer mais acusações de difamação.

.

O acusado venceu o primeiro julgamento relacionado ao movimento MeToo na China. Na semana passada, a Justiça ficou do lado de Zhou e contra Wang. Apesar de não ter que pagar uma indenização, o tribunal ordenou que ela pedisse desculpas e excluísse seus posts de acusação.

.

Na China, o acusador pode rapidamente se tornar o acusado. Pelo menos seis homens acusados publicamente de agressão sexual ou assédio processaram seus acusadores, ou pessoas que publicaram as alegações desses acusadores, por difamação no ano passado.

.

De fato, dos 34 processos movidos na China entre 2010 e 2017 relacionados a assédio sexual no local de trabalho, 19 deles foram movidos pelos autores acusados, de acordo com o Centro de Desenvolvimento de Gênero Yuanzhong de Pequim, um grupo de defesa dos direitos das mulheres. Mais da metade foi movida por acusadores de assédio contra seus empregadores, citando demissão injusta ou danos à sua reputação. Em um caso, uma vítima teve que compensar seu assediador por danificar seu tímpano depois que ela lhe deu um tapa. As mulheres que disseram ter sido perseguidas entraram com apenas dois dos processos.

.

À medida que o movimento #MeToo se espalhou pelo mundo, homens nos Estados Unidos, França, Índia e em outros países recorreram aos tribunais, às vezes argumentando com sucesso que foram difamados por seus acusadores ou pela mídia. O exemplo mais famoso pode ser Geoffrey Rush, o ator australiano, que em abril ganhou pelo menos 608 mil dólares do jornal The Daily Telegraph, na Austrália.

.

Mas ativistas do movimento #MeToo dizem que a China representa um exemplo extremo de uso de tribunais para reprimir acusações. Isso pode fazer com que as mulheres pensem duas vezes antes de denunciarem seus agressesos em uma sociedade altamente patriarcal, dizem os ativistas.

.

O governo promulgou leis proibindo o assédio sexual, mas não define o que pode ser enquadrado no termo. A aplicação da legislação também é fraca. As leis de difamação são desenhadas para favorecer os acusados, com o ônus maior de prova caindo sobre a vítima. Se ela falhar, presume-se que ela é “subjetivamente culpada”.

.

As vítimas são frequentemente pressionadas a permanecer caladas, disse Li Ying, advogado e diretor do Centro de Desenvolvimento de Gênero de Yuanzhong. “Toda a nossa sociedade ainda é tendenciosa e estigmatiza as vítimas de assédio sexual”, disse.

.

.

Hashtag proibida

.

Em certa medida, no entanto, o movimento #MeToo mudou a China e inspirou dezenas de mulheres a exigir investigações sobre seus chefes, professores e colegas de trabalho. Em agosto, o governo atualizou seu código civil para aumentar as obrigações dos empregadores chineses para evitar assédio sexual.

.

Mas Pequim suprime as discussões on-line #MeToo porque teme movimentos sociais que não consegue controlar. As alegações on-line de má conduta sexual foram um dos tópicos mais censurados na plataforma de mensagens WeChat em 2018, de acordo com o WeChatscope, um projeto de pesquisa da Universidade de Hong Kong. As hashtags #MeToo e #Woyeshi (“eu também” em chinês) são proibidas na internet chinesa.

.

Talvez o exemplo mais famoso de um processo de difamação relacionado ao #MeToo na China seja o apresentado por Richard Liu, magnata do comércio eletrônico no país. Liu, fundador da varejista on-line JD.com, está processando dois blogueiros chineses por comentarem as alegações de que ele estuprou uma estudante chinesa na Universidade de Minnesota no ano passado, após um jantar de negócios. Liu, que não foi acusado de um crime, está exigindo 436 mil dólares, mais despesas legais e um pedido de desculpas.

.

No ano passado, Zhou Xiaoxuan tornou-se o rosto do movimento #MeToo na China após Zhu Jun, uma âncora da China Central Television, a emissora estatal, de assediá-la sexualmente em 2014. No ano passado, Zhu entrou com um processo de difamação contra ela, alegando que suas acusações são “descaradamente fabricadas e cruelmente difundidas” buscando cerca de 95 mil dólares por danos. Zhou Xiaoxuan rebateu e processou Jun, alegando danos à sua dignidade.

.

Em julho, um tribunal na cidade de Shenzhen julgou um caso de difamação apresentado por Xu Gang, ex-professor da Universidade de Illinois Urbana-Champaign, contra o professor da Universidade Wesleyana, Wang Ao, depois que Wang postou nas redes sociais que várias estudantes haviam sido assediadas por Xu. Xu negou as acusações, que seu advogado disse serem difamatórias.

.

Em setembro, Wang Ao e duas ex-alunas de Xu entraram com uma ação em Illinois, acusando Xu de estupro, abuso sexual e agressão. No mês seguinte, o tribunal chinês ficou do lado de Xu e concedeu a ele mais de 14 mil de dólares.

.

.

Anos de silêncio

.

Os incidentes geralmente ocorreram há muito tempo e as vítimas muitas vezes não mantêm as evidências, dificultando a comprovação dos casos. Belinda He, que há nove anos era estagiária em uma revista semanal chinesa, acusou um colega mais velho de beijá-la à força e de tirar a roupa em um quarto de hotel. Ainda assim, ela não divulgou suas alegações por um longo tempo.

.

Quando Zou Sicong, outro ex-jornalista, ouviu o relato de He, ficou indignado. Depois que escreveu um artigo sobre o incidente, ela o repassou a Zou, que o postou em sua conta pessoal no WeChat em agosto de 2018. O artigo nomeou o acusado, Deng Fei, o principal correspondente da revista. Belinda He foi identificada como “Lady C.”

.

Três meses depois, Deng processou Zou por difamação. Em agosto, ela recebeu uma notificação judicial de que Deng também havia decidido processá-la pela mesma acusação. Zou disse que quer ajudar mulheres como He a buscar justiça e defender sua liberdade de expressão. “Faz parte do meu sistema de valores e estou disposto a pagar o preço por isso”, disse ele.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

.

.

.

.

.

.

.

.

.

.

.

.

.

.

.

.

.


Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Compartilhe

Compartilhar no facebook
Facebook
Compartilhar no twitter
Twitter
Compartilhar no linkedin
LinkedIn

HOME