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Antes sem nome definido, o feminismo periférico é a força da quebrada

Saiu no site UNIVERSA

 

Veja publicação original:   Antes sem nome definido, o feminismo periférico é a força da quebrada

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Por Flávia Martinelli

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Com colaboração de Stefanni Mota, Monise Cardoso, Hysabella Conrado e Gabriela Rodrigues, especial para o Blog MULHERIAS

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O que se costuma chamar de periferia não é um bloco único, e cada quebrada tem sua própria identidade. Assim como o feminismo. “Só o plural é capaz de respeitar tantas peculiaridades e singelezas”, diz a pesquisadora Juliana Borges, negra, estudante de antropologia e autora do livro “O que é Encarceramento em Massa?”, da coleção Feminismos Plurais.

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De acordo com a especialista, não existe uma base teórica que trate como um todo as lutas das mulheres periféricas. “De fato, as pautas se aproximam do feminismo popular na luta por direitos e políticas públicas como saúde e moradia, mas não se resumem a isso. Essas mulheres estão construindo diversas formas de resistência e sobrevivência há muito tempo, desde sempre, mesmo que não se identifiquem como feministas.”

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Hoje, Dia da Mulher e aniversário da Universa, o blog Mulherias, que nasceu de espaços de irmandades femininas das quebradas, pede licença para falar desse movimento sem nome que é personificado e praticado diariamente em cada mulher periférica ao, simplesmente, existir.

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É o caso de Maria Cecília de Luna, ou melhor, a Dona Lurdes que chegou da Paraíba nos anos de 1960 na Vila das Belezas, na Zona de Sul de São Paulo, e se reuniu com mulheres do bairro para montar uma escolinha porque não havia creche no local. Logo o grupo se tornou uma associação de bairro que cobrava saídas da prefeitura para a precariedade do saneamento básico, luz, asfalto e moradia da região. Tudo, elas conquistaram na marra.

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O local que Dona Lurdes “plantou” tem piscinas, oferece educação básica, aulas de informática, cursos de graduação e pós, atividades culturais todos os dias para a comunidade e em várias linguagens (música, dança e teatro), recreação e uso livre dos espaços. Na mesa de café coado na hora com bolo de fubá, Dona Lurdes sorri satisfeita enquanto diz: “ninguém faz nada sozinha, minha filha, isso foi uma coisa que a vida me ensinou.”

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O feminismo periférico também esteve diariamente na vida da operária Roseli Maria Meneguesso. Ela não se conformou em ver o sufoco de uma mãe de cinco filhos que morava num barraco de madeirite no fim de sua rua, em Diadema, no bairro Jardim Arco Íris. Falou com vereadores, buscou auxílio moradia na prefeitura. Sem sucesso, bateu de porta em porta nos vizinhos pedindo doações e conseguiu material para a construção de uma casa para a mulher. Conseguiu dinheiro só para pagar o pedreiro e durante três meses. Então, Roseli e outras mulheres doaram seu tempo livre para trabalhar de servente e assentar tijolo por tijolo para a vizinha.

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Há muito feminismo nas lavadeiras da cidade de Almenara, no interior de Minas Gerais, que desde sempre fazem música enquanto caminham juntas até a beira do Rio Jequitinhonha. Carregam trouxas de roupa nas cabeças, cantam versos que falam de dor, de fé e do cotidiano pelo sustento de suas casas. A cantoria é antiga e por volta de 1990 virou um coral que viajou em shows por outros países. Se do trabalho veio a arte, dela surgiu a força de um feminismo que busca novas saídas e novos espaços.

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E quantas mães não são aquela que está no busão angustiada? Sua maior indignação talvez não seja a diferença salarial entre homens e mulheres, mas a flexibilização de horários para que não seja mal vista pelo chefe, e a precariedade do transporte público, que rouba diariamente seu tempo com os filhos. A necessidade de creches nos locais de trabalho ou perto de casa, para não mais deixar os pequenos cuidando um do outro, é assunto do feminismo das mulheres das periferias. Assim como a concentração de empregos nos centros das cidades. Por que não há incentivos fiscais para empresas que poderiam se instalar no seu bairro?

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É um feminismo diário que vai muito além do sutiã ou de escolhas individuais. O feminismo nas margens das cidades e dos olhares da sociedade é uma causa coletiva. É luta de todas nós.

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Para saber mais: O documentário “Mulheres Periféricas – Apoiadas por mais de 500 mil manas”, produzido pelo coletivo Fala, Guerreira, composto por mulheres da periferia de São Paulo, registrou em depoimentos as diferentes experiências e visões sobre feminismo de mulheres das quebradas de diferentes gerações.

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