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Proposta de rua com nome de trans brasileira assassinada gera polêmica em Portugal

Saiu no O GLOBO

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Ao fugir da onda de homicídios de transexuais em São Paulo, a brasileira Gisberta Salce Junior virou imigrante em Portugal, mas não escapou da violência. Acabou violentada por 14 adolescentes e assassinada no refúgio que pensava seguro: um prédio abandonado no Porto, cidade onde viveu por duas décadas.

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O crime aconteceu há 15 anos e, desde 2010, tentam batizar uma rua da cidade com seu nome. Duas propostas foram vetadas pela Comissão de Toponímia da Câmara Municipal, o equivalente às prefeituras brasileiras.

Em declaração ao Expresso, a deputada municipal Isabel Ponce de Leão, presidente da Comissão de Toponímia, disse ter “maior respeito pelo caso” antes de revelar sua posição pessoal: “Achamos que a pessoa em si nada fez em prol do Porto. Foi por isso que o pedido foi reprovado”. Procurada, a Câmara não respondeu até o momento.

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A declaração da deputada gerou polêmica e respostas de simpatizantes do movimento LGBT.

Professor de filosofia da Universidade Federal Fluminense (UFF) e pesquisador visitante na Universidade do Porto, o carioca Fábio Oliveira estuda gênero e sexualidade e rebate a deputada.

-A fala da deputada Isabel Ponce de Leão nos causa espanto e indignação. Gisberta é uma ideia que promove uma cidade, um país e um mundo mais justos. Sua história é a trajetória de muitas pessoas trans que cruzam fronteiras em busca de vida digna. Não reconhecer sua contribuição é decretar sua morte mais uma vez – disse Oliveira.

A Organização da Marcha do Orgulho LGBT no Porto  e 14 coletivos LGBTI+  divulgaram um abaixo-assinado que reúne mais de quatro mil nomes. Será entregue formalmente à prefeitura em julho como terceira tentativa de aprovar a Rua Gisberta.

– Nós discordamos (da deputada) e vamos mais longe: afirmamos que aquilo que a Gisberta fez pelo Porto já ninguém nos tira. O assassinato de Gisberta foi o motivo pelo qual a Marcha Orgulho do Porto foi fundada. A memória de Gisberta faz com que dezenas de ativistas lutem por uma cidade mais igualitária e segura para as pessoas LGBTI+, assim como faz com que milhares de pessoas saiam à rua para marchar em apoio a esta luta – diz a nota enviada ao Portugal Giro.

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A atriz Sara Barros Leitão deu apoio à causa. Ela é autora de uma das propostas recusadas pela Câmara há um ano. Leitão diz no Instagram que não obteve resposta objetiva, a não ser uma confirmação de recebimento do pedido.

Para Oliveira, a rua pode ser um marco na luta à transfobia, que persiste. Em janeiro deste ano, a transexual goiana Angelita Teixeira, residente em Portugal desde 2016, foi encontrada morta numa praia de Matosinhos, no Porto.
– O espaço público é dominado pelo medo e pela violência contra pessoas trans. Levar o nome de Gisberta à rua é dizer que as ruas também pertencem às pessoas trans – disse Oliveira.
Gisberta tinha 45 anos quando foi encontrada morta em fevereiro de 2006. Era soropositiva e estava sem casa, por isso procurava abrigo no edifício abandonado. Um grupo pequeno de adolescentes encontrou a transexual brasileira e, no início, começou a ajudá-la com alimentação.
Logo o grupo aumentou e passou a 14. Eles frequentavam o prédio ávidos por conhecerem o homem com mamas, como consta no processo. A curiosidade virou violência e Gisberta foi espancada e violentada por três dias. Estava inconsciente, mas viva, quando foi atirada no poço do prédio, onde morreu afogada.
Sua morte gerou comoção e levou o governo a criar legislação mais inclusiva. Na última semana, por exemplo, a orientação sexual deixou de fazer parte do questionário de doação de sangue.
A história virou o livro “Pão de Açúcar”, do escritor Afonso Reis Cabral. O título é uma referência à cena do crime, onde deveria haver um supermercado, mas a obra foi embargada e abandonada. Além de remeter ao cartão-postal famoso do Rio.
Depois de duas temporadas no Brasil, a peça Gisberta, do ator Luís Lobianco, estreou em Portugal em 2018. Ele teve a inspiração para a montagem após ouvir a “Balada de Gisberta”, de Pedro Abrunhosa, na voz de Maria Bethânia.

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