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Mulheres Guajarara se fortalecem com a criação de conselho

Saiu no site AMAZÔNIA REAL

 

Veja publicação original:   Mulheres Guajarara se fortalecem com a criação de conselho

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No início da formação do grupo, os líderes não aceitavam a opinião das mulheres na aldeia Januária, na TI Rio Pindaré, no Maranhão (Foto: Erisvan Guajajara)

 

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Por Erisvan Guajajara

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A mulher indígena, nos últimos tempos, vem ocupando espaços de discussões dentro e fora da aldeia. Esta é uma luta que não foi nada fácil para as mulheres Guajajara da aldeia Januária, na Terra indígena Rio Pindaré, no Maranhão. Por serem excluídas das decisões da comunidade, elas criaram o “Conselho de Mulheres” para se fortalecer e fazer parte dos assuntos debatidos dentro da terra.

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Maria Alzenir Guajajara conta que, no início, os líderes não aceitavam a opinião das mulheres e isso era muito constrangedor. Daí surgiu a ideia de ter um grupo formado só por mulheres para atuar nas tomadas de decisões dentro da comunidade.

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“Antes, nosso cacique não deixava a gente opinar em nada que fosse discutido dentro da comunidade. Foi então que decidimos nos unir e mostrar que a mulher também tem coragem para enfrentar os obstáculos da vida. Indicamos e apoiamos outro cacique que era favorável à nossa participação dentro de qualquer situação ocorrida na aldeia. Mostramos a nossa força e hoje somos referências para muitas mulheres”, ressalta Maria.

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Cintia Guajajara, coordenadora das conselheiras, fala que a iniciativa mostrou que as mulheres precisam ter voz nas deliberações que forem ser tomadas dentro do território.

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“O objetivo do conselho é se envolver em todas as tomadas de decisões dentro da comunidade. Antes, nós, mulheres, não tínhamos vez. Foi então que nos unimos para quebrar esse tabu e mostrar que a mulher pode ocupar os espaços de poder, trazendo a voz feminina para, juntos, fortalecer a luta territorial e manter viva nossas tradições”, afirma Cintia.

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O conselho já existe há quatro anos. É formado por 24 mulheres e se tornou exemplo para outras comunidades da região, que criaram outros grupos nas aldeias vizinhas para atuar nas discussões dentro da suas comunidades.

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Juntas, as conselheiras ganharam força e começaram a ter mais autonomia. Algumas mulheres começaram a produção de hortaliças para a sustentabilidade familiar dos parentes. Plantações de cebola, tomate e diversas verduras têm ajudado financeiramente as famílias da aldeia Januária. Hoje, elas já atendem cidades vizinhas com a vendas dos alimentos, garantindo sua renda mensal. As mulheres dividem os turnos, os horários e dias para plantar, colher e entregar as verduras. As tarefas são divididas por igual e todas cumprem o combinado.

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As mulheres Guajajara, ao tomarem a linha de frente de vários debates, quebram tabus dentro da aldeia, mostrando que a voz feminina precisa ser ouvida pelos caciques e pelas lideranças das diversas regiões. É isso que relata a conselheira Taynara Guajajara: “Eu cresci vendo minha mãe em vários movimentos, lutando e defendendo nossos direitos. E hoje quero fazer minha parte dentro dessa luta em defesa do nosso território. Hoje o mundo todo está mostrando o empoderamento da força feminina. Então, resolvemos trazer para a nossa comunidade essa missão: mostrar que as mulheres Guajajara podem estar tomando a frente das atividades realizadas na aldeia. E hoje somos inseridas em todo tipo de decisão dentro da terra, graças ao nosso grupo que atua junto aos guardiões”.

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As conselheiras Guajajara atuam junto aos Guardiões da floresta, como são chamados os indígenas responsáveis pela proteção e fiscalização do território. Elas são responsáveis pela articulação de projetos que possam auxiliar na defesa do território, quando ameaçado por não-indígenas que invadem suas terras para explorar suas riquezas. Enquanto algumas acompanham os guardiões em missão, outras vão atrás de parceiros que possam contribuir com a defesa da Mãe Terra.

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Uma pauta que está em discussão para o próximo ano é a questão da educação. Os povos estão demandando uma educação diferenciada, voltada para a cultura do povo Guajajara.

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“Queremos uma educação que fale da nossa cultura, das nossas origens, que possa fortalecer o nosso hoje e o nosso amanhã, resgatando tudo que muitos já perderam. [Queremos isso] Para que nossas crianças e jovens possam conhecer a fundo a nossa história. Como ela realmente deve ser contada e valorizada”, ressalta Taynara Guajajara.

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A construção desse novo modo de educar tem o objetivo de fortalecer mais ainda as tradições culturais do povo Guajajara, valorizando a cultura desde a educação de base, para que as futuras gerações possam ser inseridas na luta, conscientes do que irão defender. As mulheres também querem que seus jovens entrem nas universidades sabendo a sua verdadeira origem.

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Arlete Viana Guajajara acompanhava todo o trabalho do grupo e, ao ver o desempenho e resultados das conselheiras, resolveu participar. Hoje se orgulha de fazer parte da equipe.

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“É uma honra fazer parte do conselho e ver que hoje somos bem vistas. Estamos atuantes. Participamos de todo processo que ocorre dentro da aldeia. Por conta da nossa articulação, já temos até mulheres que são caciques em aldeias vizinhas. Então, isso mostra que a mulher também precisa estar na linha de frente das decisões que forem ser tomadas dentro da nossa comunidade.”

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As mulheres indígenas têm ganhado destaque em diversos espaços de luta, mostrando que com muita garra e coragem podem assumir grandes desafios na defesa de seus direitos.

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No processo político deste ano, um exemplo bem claro desse empoderamento feminino foi a candidatura da primeira mulher indígena a concorrer uma chapa como vice-presidente da República: Sônia Guajajara (PSOL). Nascida na Terra Indígena Arariboia, ela é ativista na luta pela defesa do meio ambiente e da Mãe Terra, além de coordenadora da Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil). Na sua luta, Sônia mostra ao mundo a realidade dos povos indígenas e a árdua luta pela demarcação de suas terras.

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O outro exemplo de conquista de uma de liderança feminina indígena é a advogada Joênia Wapichana, de Roraima. Ela foi a primeira mulher indígena a exercer a profissão no Brasil. Joênia é também a primeira mulher indígena a ser eleita deputada federal (REDE), representando Roraima, durante as eleições de 2018. No Supremo Tribunal Federal (STF), a indígena também protagonizou um marco histórico, ao ser a primeira advogada indígena da história do país a realizar uma sustentação oral durante o julgamento que definiu a demarcação da TI Raposa Serra do Sol (RR).

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Soma-se a tudo isso o fato de Chirley Pankará (PSOL) ter sido a primeira mulher indígena eleita deputada estadual por mandato coletivo. Ela é professora no Centro Municipal de Educação e Cultura Indígena no bairro do Jaraguá, na zona norte da capital do Maranhão. Ela luta pela não privatização de parques e áreas verdes, que “só favorecem o agronegócio e geram desordem social”. Melhoras na educação e a questão de que indígenas vivendo no meio urbano devem ter sua cultura e tradições respeitadas são outras pautas que a deputada defende.

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Tais fatos demonstram que é a hora e a vez das mulheres indígenas assumirem seus espaços de poder. É chegada a hora de mostrar que haverá muita resistência, pois foram 518 anos de ataques e massacres aos direitos dos povos indígenas. E agora, a força feminina está atuante em todo canto: seja no campo, na aldeia ou na cidade, a luta por direitos e pela terra nunca irá acabar. Demarcação já.

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Os Guajajaras falam a língua Tupi-Guarani. Eles, que formam uma população de mais de 30 mil pessoas, vivem em 12 Terras Indígenas no estado do Maranhão, na região da Amazônia OrientalAraribóia, Bacurizinho, Bacurizinho (reestudo), Cana Brava, Caru, Geralda/Toco Preto, Governador, Logoa Comprida, Morro Branco, Rio Pindaré, Rodeador, Urucu-Juruá e Vila Real.

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A TI Rio Pindaré, visitada pela autor dessa reportagem, fica às margens da BR-316, na altura do km 254, localizado no município de Bom Jardim. O território fica entre os municípios de Santa Inês, Monção e Alto Alegre do Pindaré. O território é composto por oito aldeias: Tabocal, Januária, Areião, Areinha, Aldeia Nova, Novo Planeta, Alto do Angelim e Piçarra Preta.

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Segundo o Instituto Socioambiental (ISA), a história do povo Guajajara, que se auto denominam de Tenetehara, foi marcada tanto por aproximações com os brancos como por recusas totais, submissões, revoltas e grandes tragédias. A revolta de 1901 contra os missionários capuchinhos teve como resposta a última “guerra contra os índios” na história do Brasil.

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Esta reportagem faz parte do projeto “Olhando por dentro da Floresta Amazônica”, da Amazônia Real, que está voltado para a produção de matérias especiais e conteúdo audiovisual sobre a realidade dos povos da Amazônia, sobretudo das populações indígenas, quilombolas, extrativistas, ribeirinhas, defensores do meio ambiente, defensores dos direitos humanos, impactadas por megaempreendimentos na região amazônica.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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