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É PRECISO SER FEMINISTA, POR TATI BERNARDI

Saiu no site AGÊNCIA PATRÍCIA GALVÃO

 

Veja publicação original:  É PRECISO SER FEMINISTA, POR TATI BERNARDI

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Posso tomar a liberdade de crescer, amadurecer e me arrepender?

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Posso começar de novo? Posso tomar a liberdade de crescer, amadurecer, me tornar uma pessoa melhor e me arrepender? Se um dia foi preciso ser feminista, neste 2019 é uma questão de sobrevivência. Eu era contra as feministas enfadonhas, mas, gente, isso é de uma estupidez! Então eu também sou contra os biólogos, os vendedores de capinhas de celular, os ruivos e os observadores de pássaros. Porque certamente alguns, dentre todos esses citados, são insuportáveis. Vou aqui me corrigir: eu sou contra os chatos (e, por essa razão, fico contra mim várias vezes ao dia). Deixemos o feminismo fora dessa.

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É preciso ser feminista. Uma mulher é desfigurada, espancada por quatro horas pelo desgraçado psicopata que conheceu na internet. E, em nome de um dia menos miserável, eu te imploro: jamais leia os comentários abaixo de tal notícia. Sim, o número de gente que culpa a vítima e não o agressor é maior do que um estômago digno poderia suportar.

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É preciso ser feminista. Uma senhora, casada há 40 anos, é morta pelo marido depois de comunicá-lo que pretende se separar, pois não aguenta mais ser agredida.

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É preciso ser feminista. Ontem, conversando com uma amiga diretora de cinema, soube que ela está fazendo um documentário sobre estupro e que, nas zonas mais carentes da cidade, é alarmante o índice de pais que violentam a própria filha, motivados pelo seguinte pensamento: “se em breve alguém vai tirar o cabaço delas, que seja EU”.

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É preciso ser feminista. No estado de São Paulo, uma mulher é vítima de feminicídio a cada 60 horas. Um casal famoso se separa, e 99% das matérias culpam uma outra mulher (e não o homem ou o casal ou o fim do amor). Um deputado emoldura e coloca na parede de seu gabinete um pedaço da placa destruída com o nome da vereadora assassinada Marielle Franco.

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Minha filha estava brincando sem camiseta e de shortinho verde no playground do meu prédio, e um personal, dando aula para um senhor idoso, comentou: “Agora tá desse jeito, nem dá pra saber se é menina ou não, não botam mais brinco, não botam mais vestido”. Minha filha tem um ano.

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É preciso ser feminista. Eu gosto que segurem a porta para eu passar. Eu gosto quando meu marido me leva para jantar e paga a conta. Eu gostei de 75% das cantadas que levei no trabalho, quando era mais nova e solteira e estava a fim de tudo aquilo. Eu detesto fiu-fiu, mas acho que algumas amigas têm mais preconceito com motoboy do que medo de assédio.

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Eu achei aquelas atrizes do #metoo, que desfilaram no Globo de Ouro abraçadas a sua “minoria preferida” como se desfilassem bolsas de marca, um tantinho oportunistas. Tudo bem, podemos discutir isso.

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Podemos ter preguiça de algumas coisas. Ponderar pode ser um importante movimento de complexar e fomentar o discurso. Mas é preciso, apesar de tudo —e mais que tudo—​, com paixão e intensidade, ser feminista.

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Lembro como aquela febre da campanha #primeiroassedio me irritou. Cheguei a falar na minha terapia: “Então agora tá na moda dizer que foi violentada?”.

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Reproduzindo machismo, na época culpei as vítimas, e não os agressores. A hashtag não foi fácil de engolir porque me trouxe a lembrança, há muito soterrada, de um primo da família que gostava de me dar tapinhas na bunda e “benzidas” nos seios. Eu nunca fui feminista —e acho que ainda não sou. Ainda assim, a cada dia que passa eu tenho mais certeza: é preciso ser feminista.

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Tati Bernardi é escritora e roteirista de cinema e televisão, autora de “Depois a Louca Sou Eu”.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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