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Constituição de 1988 foi avanço nos direitos das mulheres

Saiu no site TERRA

 

Veja publicação original:  Constituição de 1988 foi avanço nos direitos das mulheres

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Lei fundamental representou grandes progressos na igualdade de direitos e abriu caminho para legislações voltadas aos crimes contra a mulher, como a Maria da Penha. Mas para isso foram necessários pressão e empenho.”Homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações”, estabelece o artigo 5º da Constituição Federal, promulgada no dia 5 de outubro de 1988, há 30 anos.

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Trinta anos depois, brasileiras ainda lutam para que seus direitos sejam respeitados
Trinta anos depois, brasileiras ainda lutam para que seus direitos sejam respeitados
Foto: DW / Deutsche Welle

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Parece óbvio para os tempos atuais, mas a frase representa uma das maiores conquistas das mulheres brasileiras. “A Constituição de 1988 é a primeira a estabelecer plena igualdade jurídica entre homens e mulheres no Brasil”, afirma a socióloga e feminista Jacqueline Pitanguy.

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Apesar de não ser colocado em prática em sua totalidade, o atual texto constitucional trouxe importantes avanços para as mulheres, tendo mudado radicalmente o status jurídico das brasileiras, que até 1988 estavam em posição de inferioridade e submissão em relação aos homens.

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“Conseguimos conquistas em várias áreas. No capítulo da família, por exemplo, conseguimos eliminar a figura do homem como chefe da relação conjugal”, afirma Pitanguy. “No âmbito da violência, afirmamos que era dever do Estado coibir a violência intrafamiliar, o que forneceu a base para que se formulasse a Lei Maria da Penha.”

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Aprovada em 2006, a Lei Maria da Penha é considerada pelo Banco Mundial referência global no combate à violência contra a mulher no ambiente familiar e doméstico.

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Pitanguy fala “conseguimos” porque foi uma das responsáveis pelas conquistas na Constituição de 1988. Como presidente do então recém-criado Conselho Nacional dos Direitos da Mulheres (CNDM), ela coordenou a campanha nacional Mulher e Constituinte, que uniu mulheres de diversos setores da sociedade para debater quais direitos a Constituição deveria contemplar.

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“O CNDM fez um trabalho ininterrupto de 1985, antes da eleição para a Assembleia Constituinte, até a promulgação da Constituição, em outubro de 1988. Durante quatro anos, minha vida esteve diretamente ligada ao processo constituinte”, lembra a socióloga.

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Por 20 meses, o CNDM pediu a mulheres de todo o país que enviassem propostas que gostariam de ver na Constituição. “Numa época sem internet, recebemos milhares de cartas e telegramas”, lembra a feminista. Com a ajuda de juristas, o conselho transformou essas propostas na Carta das Mulheres Brasileiras aos Constituintes, que serviu de base para o trabalho dos constituintes.

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Em março de 1987, as integrantes do CNDM e deputadas entregaram a Carta das Mulheres Brasileiras aos Constituintes ao presidente da Assembleia Nacional Constituinte, deputado Ulysses Guimarães.

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“Tenho várias lembranças marcantes desse período, como o sentimento de solidariedade dos mais diversos movimentos de mulheres de todo o país. Mas também lembro de sentir o peso das forças contrárias ao nosso avanço”, recorda Pitanguy.

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Graças à pressão das mulheres, cerca de 80% da Carta das Mulheres Brasileiras aos Constituintes foi incluída na Constituição de 1988.

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Lobby do Batom

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Com os slogans “Constituinte para valer tem que ter palavra de mulher”, “Constituinte para valer tem que ter direitos da mulher” e “Constituinte sem mulher fica pela metade”, a campanha Mulher e Constituinte era uma resposta à baixa representação feminina na política institucional: em 1935, a elaboração do texto constitucional teve a participação de somente uma mulher, a deputada paulista Carlota Pereira de Queiroz. Em 1988, a situação era melhor, mas ainda muito desigual: dos 559 parlamentares da Constituinte, 26 eram mulheres.

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“Quando os parlamentares iniciaram os trabalhos da Constituinte, eu e grupos de mulheres íamos diariamente ao Congresso para visitar lideranças de todos os partidos”, conta Pitanguy. “Para cada capítulo que era discutido, e que era de interesse das mulheres, apresentávamos nossas propostas. Se era um tema de direitos trabalhistas e benefícios sociais, por exemplo, íamos acompanhadas de empregadas domésticas, trabalhadoras e sindicalistas.”

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Essa articulação do CNDM e de demais mulheres da sociedade civil em geral no Congresso ficou conhecida como Lobby do Batom. “Alguns congressistas tentaram nos diminuir e diziam pejorativamente ‘lá vem as mulheres de batom’. Então decidimos assumir o título de O Lobby do Batom como uma estratégia de luta pelos direitos das mulheres e começamos a usar esse nome nos nossos materiais, campanha e publicações.”

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“O Lobby do Batom era uma forma irônica de as mulheres se identificarem fora da Câmara dos Deputados. Dentro da Câmara, a pauta das mulheres era representada pelas deputadas, conhecidas como Bancada Feminina”, lembra a historiadora Celi Pinto. “É muito significativo que mulheres de vários partidos e ideologias tenham se unido e buscado, num ambiente tão masculino e machista como a Câmara, uma representação a partir da própria condição de ser mulher”, analisa

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Os avanços de 88

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Para Pitanguy, uma das maiores contribuições da Constituição de 1988 para a população feminina é que o texto serviu de base para que fossem criadas legislações que abordassem especificamente os crimes contra a mulher, tipificando esses crimes.

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Antes da Lei Maria da Penha, por exemplo, era comum que os agressores fossem punidos com penas alternativas, como o pagamento de cestas básicas, e não fossem presos. Com a nova lei, penas alternativas à prisão foram proibidas, e uma série de medidas de proteção à vítima e seus filhos foram criadas.

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“Avançamos em várias áreas: nos direitos reprodutivos, conseguimos que se reconhecesse o direito de a mulher de decidir sem coerção sobre o número de filhos que deseja ter e que é dever do Estado fornecer meios e informações para tal decisão. Na área familiar, eliminamos a necessidade de um certificado de casamento para que se reconhecesse uma família”, explica a socióloga, lembrando que, até a Constituição de 1988, vigorava o Estatuto da Mulher Casada, que previa a necessidade de autorização do marido para as mulheres poderem trabalhar.

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Na área trabalhista, Pitanguy lembra que a licença maternidade foi estendida de 84 dias para 4 meses e que a licença paternidade foi instituída. “Também avançamos na afirmação de direitos trabalhistas e previdenciários para empregadas domésticas, que foram consolidados com a PEC das Domésticas de 2012.”

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A feminista também destaca a conquista para as mulheres rurais do direito à titularidade da terra e, para as mulheres presidiárias, o direito de amamentar os filhos.

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Celi Pinto aponta, no entanto, que questões como o direito ao aborto e o reconhecimento do direito à livre expressão sexual para lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros não foram contemplados até hoje.

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Para a historiadora, o movimento das mulheres em 1987 e 1988 em torno da Constituinte havia sido a maior mobilização feminina na história do Brasil – até 2018. “Ou melhor, até as eleições presidenciais de 2018, já que a maior mobilização política das mulheres no Brasil está acontecendo neste momento, com o movimento #elenão.”

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“Mais uma vez, vemos uma mobilização de mulheres acima das diferenças de classe e de raça, pois é uma luta contra o autoritarismo”, afirma Pinto. “O #elenão já mudou a relação das mulheres com a política nacional e terá efeitos muito impactantes nas próximas eleições. Acredito que a política brasileira não será mais a mesma após esta mobilização.”

 

 

 

 

 

 

 

 

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