HOME

Home

ONG ajuda a resgatar autoestima de vítimas de violência doméstica

Saiu no site MÍDIA NEWS

 

Veja publicação original:  ONG ajuda a resgatar autoestima de vítimas de violência doméstica

.

Há 6 anos, ONG Lírios é mantida com a ajuda de doações e atende 20 mulheres por semana

.

Por Bianca Fujimori

.

Pensando em restaurar o psicológico de mulheres que foram vítimas de violência doméstica, um grupo de seis mulheres se uniu e fundou em 2013 a Liga de Reestruturação das Irmãs Ofendidas no seu Sentimento ou apenas Lírios.

.

De acordo com a assistente social e membro da direção, Renata Rodrigues de Moraes, a ONG auxilia as vítimas a encontrarem a sua força para reerguer a vida e ter a capacidade de escolher o que é melhor para ela.

.

“Os hematomas somem, mas fica uma ferida aberta naquela mulher, no seu sentimento, na sua autoestima. Além dos parceiros agredirem-nas, também fica o psicológico abalado”, afirmou.

 ,

Ao todo são 21 voluntários entre psicólogas, estagiárias e recepcionistas. A Lírios atende 20 mulheres por semana e chegou a ter 125 assistidas em 2018.

.

“Geralmente, quando essas mulheres chegam para nós, os direitos delas já foram violados, já passaram pela delegacia, já fizeram todos os procedimentos. Aqui é para ela se fortalecer”, explicou Renata.

.

A ONG, localizada no Bairro Jardim Imperador 2, em Várzea Grande, é mantida com doações, contribuição de voluntários e da venda dos produtos doados para o bazar. Por conta disso, o tratamento psicológico é totalmente gratuito para as assistidas.

.

Em parceria com outras instituições, a organização promove atividades como a do Movimento das Mulheres, os 16 dias de ativismo pelo fim da violência contra a mulher, também atua na Rede de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas e na Rede de Enfrentamento Contra a Violência Doméstica.

.

A entidade também oferece cursos profissionalizantes para as mulheres recuperarem-se financeiramente e até mesmo reconquistar a guarda dos filhos.

 .

“Nós ministramos curso de empreendedorismo, marketing… Vieram vários palestrantes do Procon dando orientações, cursos de artesanato, cursos profissionalizantes”, disse a voluntária.

 .

Como parte do tratamento, há o projeto ConverCHÁ, que é uma terapia em grupo onde as mulheres podem se identificar com as histórias contadas pelas outras vítimas.

 .

“A partir do momento que você começa a falar dos seus sentimentos, a identificar, você começa a ter essa libertação. O tempo depende de cada um para superar. Esse sentimento que vai ficando guardado só vai prejudicar”, expôs Renata.

.

.

Mudando vidas

.

A assistente social explica que muitas vezes a mulher não sabe que vive em um ciclo de violência. O tratamento psicológico ofertado pela instituição vem para ajudar a vítima a perceber o cenário em que está.

 .

“Ela vai decidir se vai ficar com o homem ou se vai dar um basta. Nós percebemos que ela sai de um, mas vem outro do mesmo jeito e as coisas vão se repetindo. O tratamento psicológico é para ver até que ponto é esse amor, até que ponto vai ter respeito, se é ciúmes, controle. É para ela se conhecer”, apontou.

 .

Renata diz que também já viu casos em que o companheiro de fato mudou, mas tudo com ajuda da terapia. Em um relacionamento específico, o casal vivia em um vínculo de agressão que era considerado normal.

 .

“Ele batia nela, ela batia nele e ficava aquilo. E hoje, depois de dois anos, o relacionamento deles mudou totalmente. Aquela violência foi cessada a partir do momento em que ela se conheceu e impôs limite. Tudo começa pela atitude”, revelou.

 .

Recentemente, a ONG passou a atender duas meninas de 11 anos que foram abusadas por familiares. Uma foi estuprada pelo avô e a outra pelo tio. Nestes casos, os pais das meninas também fazem acompanhamento psicológico para conseguirem lidar com a situação.

 .

“A mãe e a filha precisam fazer o tratamento. Só uma fazer não resolve porque uma tem que saber lidar com a situação. Aí vem o pai e a mãe. A gente não atende homem, mas nesse caso é a família”, explicou Renata.

 .

Ela também já foi vítima de violência em casa. Renata contou que seu pai sempre foi muito machista e procurava motivos para desmerecê-la.

.

.

Meu medo era do que as pessoas iam achar. Eu nunca tive medo dele. Eu tinha medo do julgamento que as pessoas iam ter de mim

.

“Eu vejo a violência, o machismo, desde o meu pai. Hoje em dia ele mudou. Mas, por exemplo, se a gente caísse já era motivo de dar um tapa. As violências verbais eu sempre escutei, hoje em dia não. O controle também”, relembrou.

.

Hoje, a voluntária tem uma filha de 11 anos que é tão empoderada quanto a mãe, que dirige uma ONG de apoio a mulheres.

.

“Eu acho que essa geração não vai mais aceitar isso, as crianças estão muito inteligentes, as mulheres principalmente. Ela não deixa o irmão montar nela”, afirmou.

.

.

Declínio

 .

Cláudia Silva (nome fictício para preservar a identidade da vítima), de 44 anos, foi uma das mulheres que recebeu o apoio da Lírios e conseguiu se reerguer. No entanto, ela chegou até a ONG já no extremo da sua saúde psicológica.

 .

Ela conta que estava muito depressiva, com síndrome do pânico, não conseguia dormir e comer. Tudo por causa de um relacionamento abusivo que durou 16 anos.

 .

“Era um relacionamento doentio, não era nem mais abusivo. Tinha muitas agressões físicas, muitas agressões verbais e isso é o que dói mais. As palavras ferem a alma da gente. Não tem Rivotril que cure as marcas”, disse.

 .

Cláudia revelou que desde o começo o relacionamento já era repleto de violência. Depois de um tempo, ela passou a acreditar em todas as ofensas que eram proferidas por se marido na época.

 .

“Quando a gente passa por isso, você não se enxerga. Quando uma pessoa diz algo que você não gosta e você abaixa a cabeça, se cala, você está concordando com isso”, apontou.

 .

Apesar de ter sua independência financeira, as brigas ainda eram constantes. O marido não gostava que ela trabalhasse, pois ela saía de manhã e só voltava à noite.

 .

Além disso, Cláudia era dependente emocionalmente do esposo. Com isso, ela acabou se anulando para viver em função do homem.

 .

“Hoje, analisando, eu era totalmente dependente daquele homem. Eu não tinha vontade própria. Eu só saia com ele junto, mesmo tendo briga, tinha que ser junto. É horrível isso”, afirmou.

 .

Ela só percebeu que a situação estava insustentável quando precisou abandonar o trabalho por não conseguir mais realizar as tarefas diárias como comer e dormir. Como pedagoga, ela trabalhava com 24 crianças, mas percebeu que isso podia ser prejudicial para alguém.

 .

“Foi quando eu vi que estava doente e eu tive que largar meus alunos na mão de outra pessoa que eu não sabia se ia cuidar bem deles, se ia tratar eles bem. Mas se eu continuasse, eu ia acabar. Eu já não dormia mais. Eu não aguentava mais o barulho das crianças. Eu estava sufocada”, desabafou.

 .

No entanto, Cláudia não conseguia se libertar do relacionamento abusivo. Por ter sido criada em uma família conservadora, sempre ouviu que seu papel era arrumar um marido, cuidar da casa e dos filhos. Falar em separação era o fim do mundo na casa dela.

 .

.

Quando a gente passa por isso, você não se enxerga. Quando uma pessoa diz algo que você não gosta e você abaixa a cabeça, se cala, você está concordando com isso

.

“Na família falavam que mulher não se separa e se separar é considerada vulgar. Tem que casar, ser mãe, ter filhos e só”.

.

Ela conta que, na sua família, a mulher deveria sempre abaixar a cabeça e obedecer, sem questionar. Ela atribui seu medo de sair do relacionamento a essa criação rígida.

.

“Por isso eu acho que deixei as coisas irem lentamente. Eu poderia ter visto que não estava bom para mim e ter ido embora, mas eu não fui por medo, por fraqueza”, expôs.

 .

“Meu medo era do que as pessoas iam achar. Eu nunca tive medo dele. Eu tinha medo do julgamento que as pessoas iam ter de mim”, completou Cláudio.

.

.

Reflexão

 .

Pouco depois de largar o emprego, Cláudia passou a repensar sobre o seu relacionamento. Ela conta que sempre houve brigas, mas havia aquela promessa de que ele iria mudar.

 .

“Passava uma semana, um mês, tudo maravilha. De repente volta tudo de novo. Eu fui cansando aos poucos. Eu via que as mudanças não aconteciam. Tinha promessas, planos, mas não fazia. Eu fui cansando e chegou a um ponto em que eu explodi, para mim não dava mais”, confessou.

 .

Ela disse que também chegou a procurar apoio em algumas amigas, mas que não encontrou. Isso a deixou ainda mais perdida.

 .

“Uma amiga minha falou para mim: ‘ruim com ele, pior sem ele’. Aí, como você vai fazer? Era uma pessoa que eu pensei que teria apoio. Será que eu ia ter que voltar para a minha casa?”, indagou-se Cláudia.

 .

Porém, quando ela menos esperava, se deparou com a ONG Lírios. Cláudia revelou que estava andando pela rua e resolveu passar por um beco. De repente ela dá de frente com a placa da entidade.

 .

“Aí eu bati, tinha gente lá e entrei, contei a minha história para eles e me ouviram. De lá para cá, já são quase dois anos que recebo acompanhamento deles”, relembrou.

.

.

Renascimento

 .

Já tomada a decisão de se separar do marido, Cláudia saiu de casa e passou a fazer terapia na ONG para cuidar da sua saúde emocional. O início foi muito pesado para ela, até que ela encontrou a libertação.

 .

“Não foi muito fácil. Foi um período bem doloroso porque você vai resgatar de novo emoções, as dores, contar tudo”.

 .

Além da terapia, Cláudia também recebeu muita ajuda do seu filho e de uma amiga para restaurar a sua autoestima. Por causa do casamento abusivo, ela começou a usar apenas roupas que cobriam o corpo inteiro, não se cuidava mais e não enxergava a sua beleza.

 .

“Violência contra a mulher não é só o homem ir lá e te bater, até as palavras que eles falam é violência. Falam que você está gorda, que está magra demais, seu cabelo é feio, tudo isso é violência. No meu caso, foi muita coisa que foi falada”, explicou.

 .

Nesse processo, a amiga foi fundamental para que Cláudia pudesse se redescobrir. Foi a colega que passou a leva-la para sair e se divertir, além de incentivar a sua autoestima.

 .

“A minha amiga falava para eu usar batom, que eu usava bastante antes. Minha amiga me levou para sair. Eu passei a conhecer de novo a vida, que sair é bom, me dava alegria. Tudo isso a gente vai perdendo com o passar do tempo, a gente não consegue enxergar. Essa amiga minha foi muito importante mesmo. Ela começou a me valorizar”, desabafou.

 .

Conhecer a Lírios foi um divisor de águas na vida de Cláudia, com o tratamento ela começou a se ver de outra maneira e ter forças para seguir em frente. No começo não foi muito fácil, mas ela encontrou um amparo muito grande.

 .

“A primeira vez que a gente começa a contar os problemas, as suas dificuldades, é muito difícil. Mas eu tive um respaldo muito bom da terapeuta que me atendeu. Ela me fez enxergar que esse problema não era só comigo. É muito bom o acompanhamento”, afirmou.

 .

Hoje, ela conseguiu conquistar o amor próprio que tanto lhe faltava. Agora Cláudia passa todo o seu empoderamento para quem conhece. Ela tem orgulho em dizer que se ama acima de tudo e antes de qualquer outra pessoa.

 .

“Nós somos capazes de nos amar. A mulher tem que se amar primeiro para depois amar outra pessoa. Ainda falam que mulher é sexo frágil. Não somos, mas a gente vem com essa ideia de que não dá conta. A mulher dá conta, a mulher dá conta de tudo que ela pensar e imaginar”, exclamou.

.

.

.

.

.

.

.

.

.

.

.

.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Compartilhe

Compartilhar no facebook
Facebook
Compartilhar no twitter
Twitter
Compartilhar no linkedin
LinkedIn

HOME