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Mulher na política, mas em postos de vice, está, de fato, ganhando espaço?

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Veja publicação original:  Mulher na política, mas em postos de vice, está, de fato, ganhando espaço?

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Por Luiza Souto

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A determinação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em maio deste ano, de que 30% do fundo de campanhas sejam gastos em candidaturas femininas, pode ter sido o gatilho para postulantes ao cargo de governador e presidência – homens – desejarem ter mulheres em suas vagas de vice. Entre alguns exemplos confirmados estão a líder indígena Sonia Guajajara, na chapa de Guilherme Boulos (PSOL) ao Planalto, a tenente-coronel Carla Danielle Basson, confirmada como vice de Paulo Skaf (MDB) ao governo de São Paulo, e a professora Ivanete Silva, com Tarcísio Motta (PSOL) ao governo do Rio de Janeiro – posto este que seria da vereadora assassinada Marielle Franco. Jair Bolsonaro (PSL), candidato à presidência, tentou atrair a advogada Janaína Pascoal para sua chapa, assim como Geraldo Alckmin (PSDB), flertou com a senadora Ana Amélia Lemos (PP).

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Lideranças feministas e especialistas no tema apoiam esse movimento. Mas fazem ressalvas; entre elas, a de que não adianta chamar mulheres apenas para cumprir cota e, nas decisões, não dar voz a elas.

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Pela determinação do TSE, ao menos 30% do R$ 1,7 bilhão do Fundo Partidário reservado para as eleições devem ser gastos em candidaturas femininas. Também ficou decretado que 30% do horário eleitoral gratuito no rádio e na televisão será destinado a elas.

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Importante lembrar que, desde 2009, a lei eleitoral obriga o cumprimento da cota mínima de 30% para o gênero feminino, mas não havia, até agora, a imposição sobre os gastos. Nas campanhas municipais de 2016, segundo o TSE, 14,4 mil candidatas não receberam sequer o próprio voto. A suspeita é que muitas delas podem ter sido usadas como “laranjas”, apenas para preencher a cota.

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Por sugestão do ministro Luís Roberto Barroso, o recurso do Fundo Eleitoral reservado para as campanhas femininas não pode sequer ser doado a outros políticos.

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“Pode ter certeza que os partidos só estão convidando mais mulheres por conta da nova determinação. Se não a cumprirem, pagam multa. E há também um monitoramento para que as candidatas não sejam laranjas. Mas é interessante que as mulheres se apropriem dessa prerrogativa porque, a médio e longo prazo, elas terão mais poder dentro dos partidos”, avalia a socióloga Jolúzia Batista, membro do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (CFEMEA), sediado em Brasília, que estuda, debate e defende pautas do universo feminino e direitos humanos.

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Nascido em 2015 para incentivar maior número de mulheres na política, a PartidA! (um grupo formado por mulheres, com bastante expressão na internet e que incentiva uma entrada feminina mais robusta na política) concorda com a argumentação da socióloga. Uma das fundadores do movimento, a jornalista recifense Juliana Romão, considera que, mesmo na condição de vice, a mulher tem papel importante.

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“É preciso passar por diversas falsificações de projetos até a mulher ser vista e eleita”, observa a jornalista. “Claro que não é o movimento ideal. A gente queria ser o ponto-chave, mas existem vários estágios. As mulheres precisam estar em todos os lugares onde se decidem coisas nas nossas vidas”.

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A PartidA! lançou, esse ano, a campanha “Meu Voto Será Feminista”. O grupo, que se define como suprapartidário e orientado à esquerda, apoia candidatas mulheres de distintos partidos, desde que elas se enquadrem na pauta do grupo; o que significa, por exemplo, ser a favor do aborto legal e seguro, além da criação de oportunidades para pessoas negras e de políticas públicas para o combate ao feminicídio. Homens que apoiam esse tipo de pauta também têm a PartidA! como aliada, o que não quer dizer que ela o indique como um bom candidato. E o mesmo vale para partidos que tragam mulheres como vice. “A prioridade, neste momento, é votar em mulher que tenha protagonismo”, diz Juliana.

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“Às vezes, a candidatura da mulher é distante da nossa pauta. Então, infelizmente, não basta ser mulher. A Marina (Silva, candidata à presidência pela Rede), por exemplo, aparece como uma figura de centro e puxa para a direita. Não concordamos com o discurso dela, mas sabemos que é importante que ela tenha voz”.

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“Presença vexatória”

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O cientista político e especialista em marketing Antônio Lavareda classifica como “vexatória” a presença de mulheres no Parlamento e pontua que deve-se olhar esse novo movimento de forma legítima. Ele considera que discutir somente a cota de financiamento “é uma bobagem” e diz que essencial mesmo é aumentar a representatividade na Câmara, que é onde está o problema, na sua visão. Segundo ele, qualquer esforço é válido para que isso aconteça. Longe das campanhas desde 2010, o marqueteiro ajudou a eleger Roseana Sarney a governadora do Maranhão em 1994 e 1998, além da ex-governadora do Rio Grande do Norte Rosalba Ciarlini, em 2010.

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“Mesmo que seja de marketing, uma ação para que se amplie o espaço das mulheres será importante. Quando há maior presença feminina, a política tende a ser mais transparente”, acredita.

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Lavareda entende ser difícil apontar qual candidato convida uma mulher para sua chapa por puro marketing. Mas acredita que não há como um vice ser apenas decorativo. “Que o diga Michel Temer”, lembra ele, amigo e consultor do mandatário emedebista. Temer foi vice na chapa da ex-presidente Dilma Rousseff e assumiu quando a petista foi deposta, em 2016.

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Ainda que a candidata não tenha experiência na política, avalia Lavareda, o fato de ser mulher já inspira o gênero. A fala veio após ser instado a comentar o fato do candidato do MDB ao governo de São Paulo, Paulo Skaf, ter convidado a tenente-coronel da PM Carla Danielle Basson para ser sua vice. Concorrente de Skaf pelo PSB, Márcio França também teria cogitado como vice uma policial, a cabo da PM Katia da Silva Sastre. Ela ficou famosa em maio deste ano após evitar um assalto à mão armada em frente a uma escola de Suzano, na Grande São Paulo, matando o criminoso.

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“A imagem de uma policial vem para simbolizar, além da figura da mulher, a da segurança”, observa o marqueteiro.

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A coordenadora da Procuradoria da Mulher no Senado, Rita Polli, também avalia o movimento como positivo, mas alerta: “Os partidos estão nessa procura por obrigação, infelizmente; e não porque se importam com a mulher. No entanto, para elas, a novidade é positiva porque aumenta o número de projetos para mulheres, especialmente nas áreas da assistência social, saúde e direitos humanos”, afirma a coordenadora.

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Nem 9% na Câmara dos Deputados

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Mais importante do que discutir o papel da mulher numa campanha e se ela será ou não secundária no partido, é debater o número inexpressivo que ela ocupa no Legislativo, acredita a professora aposentada Caci Amaral, integrante do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral São Paulo. Caci lembra que as mulheres “são mais de 50% da população e não chegam a 9% na Câmara dos Deputados, em Brasília”

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Os números são alarmantes mesmo: o Brasil ocupa a 32ª posição em um ranking de 33 países latino-americanos e caribenhos sobre participação das mulheres nos parlamentos nacionais. Nesses espaços, só 9,9% dos parlamentares eleitos são mulheres. No ranking geral de América Latina e Caribe, o índice médio de participação de mulheres no parlamento é de 28,8%, segundo a lista de “Mulheres na Política 2017” da União Interparlamentar (organização internacional dos parlamentos dos Estados soberanos) e da ONU Mulheres. O Brasil também ocupa as últimas posições no ranking de participação feminina na Câmara e no Senado: estamos no 154º lugar, com 10,7% de participação de mulheres na Câmara e de 14,8% no Senado.

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“Se aumentasse a população feminina no Congresso brasileiro, haveria mais possibilidades de termos pautas para negras e indígenas, além do público LGBT. Essa é a preocupação fundamental”, avalia Caci.

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Ela cita avanços como na Argentina onde, em 2016, foi aprovada a igualdade de gênero na reforma eleitoral. Hoje, as mulheres no congresso de lá são mais de 30%. Em junho, talvez como reflexo dessa fotografia, os deputados e deputadas do país aprovaram o aborto numa votação histórica.

 

 

 

 

 

 

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