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‘Existem muitas formas de violência contra a mulher’, diz advogada

Saiu no site OE 10:

 

Veja publicação original: ‘Existem muitas formas de violência contra a mulher’, diz advogada

 

Por Alana Regina e Eduardo Coutinho

 

Diretora fala da importância do combate à violência contra a mulher em MS

 

À frente da ABMCJ (Associação Brasileira das Mulheres de Carreira Jurídica de Mato Grosso do Sul), Rachel Magrini Sanches luta em defesa dos direitos das mulheres e no combate à violência contra o sexo feminino. A associação é composta por mulheres de carreira jurídica e conta com a participação de advogadas, procuradoras, defensoras públicas, promotoras etc. Na entrevista, Magrini relata como são feitos os atendimentos  às mulheres do Estado, e as formas de aproximação com a família. Nas cidades do Estado, a Associação Brasileira das Mulheres de Carreira Jurídica de Mato Grosso do Sul oferece palestras de conscientização e revela quais os cuidados que as profissionais do grupo tomam diante de denúncias.

 

Sobre a Lei Maria da Penha, a diretora comenta que, apesar de ser a terceira lei de combate à violência no mundo, a Espanha sai na frente do Brasil quando o assunto é evolução. Durante a entrevista, Magrini revela que o país espanhol cuida até da preparação da criança, de modo a evitar violência direta e indiretamente. A advogada revela que muitas mulheres têm medo de denunciar e adverte que a situação precisa mudar.

 
O Estado – Atualmente as denúncias de violência contra a mulher têm aumentado cada vez mais. Qual a sua avaliação sobre a violência contra a mulher?

 
Rachel Magrini Sanches – O número tem aumentado, mas o pior é ter crescido sem a gente saber contabilizar. O feminicídio, por exemplo, você consegue contabilizar se a mulher morrer em casa, porém se a mulher for para o hospital, a causa da morte não aparece como feminicídio. Já no caso da violência doméstica, muitas vezes não é denunciada. Hoje os números não estão crescendo muito, não, mas agora estão aparecendo com mais frequência porque as pessoas estão denunciando mais.

 

 

O Estado – Existe uma delegacia especializada 24 horas para o atendimento da mulher. Mas, além disso, quais são as políticas, e o que a mulher pode buscar para realmente se resguardar?

 
Rachel – Temos passado nas escolas estaduais, em parceria com a subsecretaria do governo do Estado, e nos Cras (Centro de Referência de Assistência Social), em uma parceria com a subsecretaria do município. Fazemos isso o ano inteiro no Cras, especificamente neste mês de agosto, que comemora a Lei Maria da Penha. Visitamos ainda escolas estaduais, para levar essa informação. Campo Grande foi a primeira cidade do Brasil a ter um lugar onde pudesse sediar todos esses acompanhamentos e encaminhamentos: a Casa da Mulher Brasileira hoje tem tudo, a Delegacia da Mulher, Ministério Público voltado para isso, psicóloga, inclusive um lugar onde a mulher pode ficar protegida, no caso da concessão de uma medida protetiva. Na Casa da Mulher Brasileira temos todos os dados de como fazer o encaminhamento dessas mulheres vítimas de violência.

 

 

O Estado – A senhora falou da conscientização nas escolas, isso realmente é passado para as crianças para que possa estar no cidadão?

 
Rachel – Percebemos que várias associações que estão em parceria com a subsecretaria do Estado, a própria ABMCJ (Associação Brasileira das Mulheres de Carreira Jurídica), têm passado em todas as escolas. Cada dia fica uma, tem padrão que não conseguimos mudar, não conseguimos reestruturar várias famílias por conta da agressão já sofrida. A gente acredita que, levando para adolescentes, vamos conseguir quebrar esse padrão que parece normal, que é a violência contra a mulher. Porque eles nunca questionaram, mas reproduzem aquilo que veem em casa, e quando começam a escutar que isso é errado, que existe uma lei que combate e é crime, todos eles ficam muito interessados, sempre tem muita pergunta depois, inclusive denúncia. Quando começamos achar que ia ter mais uma conscientização para quebrar esse padrão que entendia como normal, agora, além de quebrar o padrão, estamos conseguindo receber denúncias e auxiliar vários adolescentes para que possam falar do vizinho, familiares.

 

 

O Estado – Na sua opinião, Mato Grosso do Sul é um Estado machista e conservador?

 
Rachel – Nossa, demais. É um dos Estados em que a gente mais sente esse problema, isso porque estamos à frente há vários anos. Aqui teve a primeira secretaria específica para combater a violência contra a mulher e a violência doméstica, a Casa da Mulher Brasileira, a Casa Abrigo –que é onde a mulher e sua identidade são protegidas, mas aqui [MS] é muito difícil a situação. A gente não consegue reduzir os números ainda, é assustador.

 
O Estado – A senhora como presidente da Associação Brasileira das Mulheres de Carreira Jurídica, sente esse preconceito com a mulher?

 
Rachel – Conversamos muito sobre isso, tem discriminação, preconceito, que é explícito em algumas situações com as mulheres, contudo em outros ambientes vemos que ele [preconceito] ainda é velado. Entretanto, a conduta é evidente e discriminatória, não tenho nenhuma dúvida, isso é uma constatação de todas nós que estamos na associação, tanto pessoalmente quanto profissionalmente, é demais.

 

 

O Estado – Tem algum outro trabalho que a associação faz?

 
Rachel – Sim, fazemos as palestras nos Cras, em parceria com a subsecretaria do município, mas todo mês desenvolvemos essas reuniões ajudando não só no combate à violência doméstica como também no encaminhamento. A associação ajuda neste sentido, porque tem mulheres que não conseguem falar. Auxiliamos desde os primeiros passos de encaminhamento até o momento de denunciar, prestamos essa assistência. Além disso, temos feito diversas reuniões, debates e inclusive em parceria com a Escola Superior da Advocacia.

 

 

O Estado – Nesses 11 anos de Maria da Penha, a senhora enxerga uma melhora?

 
Rachel – Sim, percebo que a lei é mais conhecida. As pessoas sabem que a lei está à disposição, mas ainda é difícil para as mulheres conseguir sair daquela situação de violência por vários fatores, como o medo de romper com a família e a dependência financeira. A mulher ainda não consegue denunciar, mas o primeiro passo, que é a conscientização, já está muito mais forte que antes. Temos de continuar esse trabalho para que de fato consigamos estancar essa violência.

 

 

O Estado – Temos a CMB, onde há o atendimento da mulher bem debilitada… 

 
Rachel – É muito legal ver o trabalho que eles estão fazendo porque, quando a mulher chega à CMB, ela é acompanhada por uma psicóloga e já ali o tratamento é diferenciado. Todos os profissionais do local foram especificamente treinados para poder receber a mulher que sofreu algum tipo de violência. É realmente um ambiente diferente para poder acolher.

 

 

O Estado – No mês passado tivemos o caso da musicista Mayara Amaral, que chocou a sociedade. Podemos perceber que a violência está começando cada vez mais cedo, isso é uma realidade?

 
Rachel – É uma realidade. Hoje em dia, a mídia dá um suporte maior para esse tipo de denúncia, conseguimos entender por que antes não tínhamos acesso a essas informações. A violência doméstica independe só de ser no núcleo familiar. Existem muitas formas de violência, e a gente explica bastante nas escolas, não é só a violência física, temos a patrimonial, psicológica, moral, sexual. Quando vamos explicando isso, homens e mulheres se assustam.

 

 

O Estado – Existe um fator determinante para que a violência aconteça?

 
Rachel – Não é a idade o fator determinante, é a situação. Aquela mulher que consegue entender que tem de denunciar, ela consegue sair daquele núcleo em que está sofrendo. Também independe de classe, vemos mulheres em situação de miséria, em que o índice é maior, mas não é exclusivo. Temos mulheres de classe média, alta, todas elas passando pela mesma situação e sem saber que têm de denunciar ou como se portar diante da violência; é triste demais.

 

 

O Estado – A associação é vinculada a órgãos internacionais. Tem alguma experiência internacional que pode ser trazida para o Brasil a fim de melhorar?

 
Rachel – Várias, todo ano temos uma reunião mundial. Em 2016, aconteceu em Buenos Aires, e este ano em Moçambique. Vemos que alguns países estão muito mais evoluídos na questão da lei, mesmo a Lei Maria da Penha sendo considerada a terceira melhor do mundo para o combate da violência doméstica. A Espanha nos dá muita experiência, inclusive de como tratar as crianças, pois observamos que a criança sofre violência direta e indireta. A forma indireta é a de ver a mãe sofrendo a violência, e a direta é quando ela é penalizada para poder penalizar a mãe. São experiências que ainda sequer são discutidas no Brasil, mas a associação discute o assunto e traz essas informações para cá.

 

 

O Estado – A conscientização é feita apenas com as mulheres?

 
Rachel – O núcleo familiar, a importância é a família, porque a mulher que consegue romper esse padrão patriarcal, e ensinar isso aos filhos; porém quando isso não acontece, o filho entende que aquela situação é normal. Temos de olhar para a mulher, para a criança e também para o homem, porque em outras experiências na justiça restaurativa, em que falamos com eles, que por sua vez são condenados a participar de palestras, debates, o índice de retorno do crime é baixo:, 5 a 6% voltam a praticar violência doméstica, porque a condenação é prisão. No entanto, quando conseguimos debater vem a conscientização.

 

 

O Estado – A associação está fazendo parte do Agosto Lilás? Qual é a agenda?

 
Rachel – Todos os dias é realizada uma palestra da associação, fora a nossa. As escolas ligaram e agendaram quais queriam receber. Vamos passar em todas essas escolas estaduais para levar, e cerca de 30 municípios se habilitaram para as palestras. Feminista é aquele que quer a igualdade de direitos, não pensa que a mulher é melhor, só quer que a mulher tenha os mesmos direitos que os homens.

 

 
Perfil
Nome: Rachel Magrini Sanches
Naturalidade: Dourados
Formação: Advogada de formação, Magrini já trabalhou como diretora-secretária-geral da OAB/MS (Ordem dos Advogados do Brasil de Mato Grosso do Sul) e diretora-presidente da ESA/MS (Escola Superior da Advocacia do Estado), durante outras gestões da entidade.
Cargo atual: Diretora da Associação Brasileira das Mulheres de Carreira Jurídica de Mato Grosso do Sul

 

 

 

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