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Peça ‘Uma relação pornográfica’ aborda relacionamento iniciado na internet

Saiu no site CORREIO BRAZILIENSE

 

Veja publicação original: Peça ‘Uma relação pornográfica’ aborda relacionamento iniciado na internet

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Em cartaz em Brasília com peça sobre relacionamento amoroso, Angela Vieira fala sobre machismo, encontros e desencontros no Brasil contemporâneo

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É pela internet que o casal de Uma relação pornográfica se conhece, mas é no mundo real que o encontro toma proporções inesperadas. A conexão entre os dois é tão grande que eles decidem se conter. Não querem seguir adiante. Esse medo da entrega fisgou a atriz Angela Vieira e a fez aceitar o convite de Guilherme Leme para encenar a peça. “O texto é muito bonito, fala de como as pessoas não têm coragem de se jogar para viver uma verdadeira história de amor”, diz Angela.

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Em cartaz no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) até o próximo fim de semana, a peça do iraniano Philippe Blasband tem direção de Victor Garcia Peralta e fala de um comportamento que Angela acredita ser universal e atemporal. No início, o casal quer apenas satisfazer fantasias sexuais.

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O pacto de não se envolver é firmado, mas a incerteza do futuro reserva para o casal outro tipo de encontro. “Vai se desenvolvendo um sentimento lindo, mas eles puxam o freio e resolvem que aquilo não iria dar certo. E, na verdade, aquilo poderia ter dado certo para o resto da vida”, conta Angela. “No decorrer do texto, você vai torcendo por eles e, depois, até lamentando que tenham chegado a uma conclusão equivocada. É um texto sobre o sentimento de duas pessoas maduras.”

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A peça estreou em 2014 com Ana Beatriz Nogueira porque Angela, na época, estava envolvida em outros projetos. Dois anos depois, ela assumiu o papel. A parceria com Leme sempre foi uma constante na vida da atriz e ela gostou da ideia de voltar a dividir o palco com o ator. Fazer teatro, aliás, é algo que ela procura realizar com certa constância. Angela calcula que já fez quase tantas novelas quanto peças, embora a tevê ocupe um tempo maior da agenda. “Depois que comecei a fazer novela seguida, passei a atuar menos no teatro porque é quase impossível fazer os dois simultaneamente. Mas acho que hoje, meio a meio”, garante. A cada dois anos, regularmente, ela se envolve em projetos que a levem aos palcos.

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“Pedinte”

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Os 40 anos de carreira completados este ano foram preenchidos com 43 projetos no cinema e na televisão, incluindo novelas e minisséries. Angela fez um pouco de tudo, mas reconhece que boa parte de suas personagens são mulheres ricas, bem-sucedidas e sempre muito elegantes. Estereótipos que nem sempre agradam à atriz. Ela confessa que fez menos personagens populares do que gostaria. “Eu sou uma pedinte”, brinca. “De uns tempos para cá, venho fazendo personagens sempre ricas. Costumo dizer que não vou pra cidade cenográfica que tenha paralelepípedo porque o salto não aguenta. Agora quero ir de sandalinha. Estou louca para fazer uma personagem popular, há muito tempo que não faço”, diz.

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A última foi uma participação na novela Fina estampa, de Aguinaldo Silva, na qual viveu uma atriz decadente contratada para se fazer passar por uma fazendeira rica. Ela também gostaria de fazer minisséries. A televisão mudou nos últimos anos e esse tipo de produção ficou mais atraente. “Atualmente, as minisséries estão oferecendo produtos mais elaborados e têm aparecido, na dramaturgia, coisas muito interessantes”, repara. A televisão está mais sofisticada, mas o machismo e a desigualdade salarial entre atores e atrizes continuam a marcar a dramaturgia nacional.

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Desde Por amor, quando Angela viveu a esposa deixada pelo marido que se apaixona por um homem, passaram-se 20 anos. Na época, a vitimização da personagem e as críticas ao homem irritaram. Para ela, os comentários foram machistas. De lá para cá, teria havido um progresso lento, mas real, na maneira de o brasileiro pensar.

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Durante as últimas eleições, no entanto, Angela ficou apreensiva. “O Brasil é um país machista, um país dos preconceitos, que ainda não se libertou daquela coisa escravocrata, classista”, lamenta. “Vínhamos num processo que considero de regular para bom para se libertar dessas coisas todas e fico muito aflita de que a gente esteja no começo de um retrocesso que vai nos custar muitos anos para retomar de onde estamos agora.”

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Uma relação pornográfica
Com Angela Vieira e Guilherme Leme. Direção: Victor Garcia Peralta. Texto: Philippe Blasband. Até 18 de novembro, de quinta a sábado, às 20h, e domingo, às 19h, no Pavilhão de Vidro do Centro Cultural Banco do Brasil Brasília (SCES, Trecho 2, Lote 22). Ingressos: R$ 30 e R$ 15 (meia-entrada).

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Entrevista// Angela Vieira

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Esse medo da entrega, você acha que é do mundo contemporâneo ou sempre existiu?
Acho que é uma coisa que sempre existiu. O ser humano, às vezes, arma umas armadilhas para si próprio que são absolutamente possíveis de serem tratadas num consultório de psicanalista. Esse medo de se doar, de se entregar ao outro, de ir em frente para ser feliz é uma coisa que acompanha certas pessoas mesmo. Sempre existiu esse medo da felicidade, de confiar completamente no outro para não se sentir, depois, frustrada, traída.

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Que impacto você acha que a internet teve nas relações amorosas?

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Acho que a internet, de certa forma, tirou um pouco as pessoas do convívio umas com as outras no dia a dia. E eu adoro gente, adoro conversar, ouvir história, mas gosto daquele convívio mesmo, de verdade, não da coisa virtual. A internet tem o seu valor. Melhorou o mundo para muitas coisas, mas ainda tenho um pouco de reservas. Por exemplo, na minha casa, ninguém senta à mesa com celular. Vejo em restaurantes, as pessoas não tiram o olho do telefone, mesmo quando não estão sozinhas. Acho isso muito chato e um pouco triste também.

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Sobre a igualdade entre homens e mulheres no mundo da televisão brasileira, você acha que houve muitas mudanças nesses 40 anos de carreira?

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Acho que mudou pouco. É uma ladeira íngreme que a gente vai subindo para ter o nosso espaço. Vem mudando, mas é difícil. É aquela cabra que sobe a montanha a duras penas. Ainda temos muita coisa para conquistar. Por que um trabalho igual, que demanda a mesma preparação, o mesmo tempo de estudo, o mesmo conhecimento não merece ter a mesma remuneração por uma diferença de sexo? Eu não consigo entender. Gostaria que alguém me desse uma resposta que fosse realmente aceitável, mas acho que não tem. A única resposta é que estamos ainda com um preconceito nas costas.

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São 40 anos de carreira: o que você ainda não fez que queria muito fazer?

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Não fiz ainda muita coisa, mas minha cabeça vai muito para o teatro. A gente tem grandes personagens para mulheres mais maduras e tem muita coisa ainda que quero fazer. Ontem mesmo estava conversando com Guilherme e falei: vamos fazer um espetáculo nosso, fazer uma personagem para minha idade.

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Como está encarando as possíveis mudanças que podem haver na cultura com o novo governo?

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Com muita tristeza. Meu primeiro sentimento é tristeza. Não só pensando na minha área, mas de modo geral. A gente lutou tanto para conseguir esse processo democrático. Eu vivi o período da ditadura, fui pra rua, para lutar pelas Diretas Já, passei por toda aquela transição e foi uma alegria. E agora vejo tudo isso com muita tristeza, essa coisa de estarem demonizando os artistas. E acho muito perigoso essa história de a igreja se envolver, um tipo de religião se envolver quase como uma censura paralela. Meu sentimento é genuinamente de tristeza. Mas estamos aqui e a tristeza não pressupõe uma depressão, ela pressupõe o seguinte: não deu, ok, vamos começar tudo de novo.

 

 

 

 

 

 

 

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