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O namoro que ninguém merece

Saiu no site REVISTA COSMOPOLITAN: 

 

Veja publicação original: O namoro que ninguém merece

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Por Letícia González

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Relacionamentos abusivos são mais comuns do que a gente pensa e mais difíceis de solucionar do que gostaríamos

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A gente tem muito a agradecer a Elza Soares, Luiza Brunet, Rihanna. Além de incríveis no que fazem, foram francas: sofreram violência do homem que amavam e levaram o assunto a público. Abriram a conversa para muitas de nós e mostraram que é possível sair dessa. Histórias assim são tão chocantes que respiramos aliviadas por conhecê-las de trás pra frente, pelo final.

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A verdade é que o meio do caminho também existe e perdura para muita gente. Porque olhar pra ele é difícil, acabamos sem saber como operar. É por isso que estudos como o “Entre Práticas Retributivas e Restaurativas: a Lei Maria da Penha e os Avanços e Desafios do Poder Judiciário (2018)”, feito pela Universidade Católica de Pernambuco a pedido do Conselho Nacional de Justiça, são importantes. Eles iluminam a dinâmica da violência e, fazendo isso, derrubam alguns mitos.

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Um deles é a tese de que uma relação violenta só se sustenta porque o homem mantém a casa. Sem dinheiro, a mulher aguentaria a agressão para sobreviver. Nem sempre. Ainda que a pressão econômica dificulte a vida, não é suficiente para explicar tudo. Se fosse, como ficaria este dado? Em Recife, uma das seis capitais estudadas, mais vítimas (31%) sustentavam o lar do que agressores (21%).

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Outra prova da complexidade: o tempo de relacionamento. A pesquisa confirma que os homens que batem conhecem bem a companheira. A maioria namora ou está casada e o número chega a 70% se somarmos os relacionamentos com mais de três anos. Que tal? Não é ladrão nem colega de trabalho. É a pessoa com quem você comemorou o aniversário, o Natal e fez filho.

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Quando os casos vão para a Justiça, algumas vítimas não querem ver seu agressor preso — elas só querem que ele pare. O número é alto: 39% das mulheres ouvidas preferem sentenças sem cadeia. Ué, apanharam e não querem a punição máxima? Uma das coordenadoras do estudo, Carolina Salazar, lembra o óbvio: “Na violência doméstica, você não pode ignorar a dimensão do afeto”.

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Os ciclos desse tipo de agressão também incluem pausas. Aí vêm pedidos de desculpas, promessas de mudança e coisas que não ocorrem depois de uma briga de bar. Precisamos derrubar o tabu que nos impede de enxergar isso. Quando uma mulher é agredida e continua com o cara, ela não mudou de categoria. É provável, inclusive, que viva cenas idênticas às do seu namoro: sentar à mesa para comer, ir ao cinema, trocar mensagem. A diferença é que ela vive um problema seriíssimo ao mesmo tempo.

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Como pessoas comuns, temos dois desafios nessa seara: 1) Fazer uma denúncia anônima. Disque 180 e apresente o caso — o processo é anônimo mesmo; 2) Parar de tratar quem apanha como alienígena. Essa mulher não precisa de mais incompreensão. Olhe nos olhos, peça detalhes, tente suportar a incongruência desse “durante”. Se ouvir é difícil, imagine falar.

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Letícia González é jornalista e mestre em sociologia pela Sorbonne, em paris. Há oito anos escreve sobre desafios femininos, direitos humanos e mulheres sensacionais. No site Calma.vc, ela investiga nossa relação com a beleza.

 

 

 

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