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#MeToo na Índia: O que aconteceu com 75 professores acusados de abuso sexual há 1 ano?

Saiu no site HUFFPOST

 

Veja publicação original:  #MeToo na Índia: O que aconteceu com 75 professores acusados de abuso sexual há 1 ano?

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HuffPost Índia perguntou a 23 universidades e faculdades do país se as acusações foram investigadas.

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Por Piyasree Dasgupta

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Um ano atrás, quando Raya Sarkar, então com 24 anos, decidiu publicar uma lista com dezenas de nomes de homens acusados de assediar sexualmente mulheres que faziam parte de sua rede estendida de amigos, ela tinha a dimensão do risco que estava correndo. A ideia de “dar nome aos bois” dos supostos culpados não é considerada legítima por um grande número de feministas, e, dias antes da divulgação da lista, o HuffPost americano teve de tirar do ar um artigo de autoria de Christine Fair, no qual a acadêmica acusava um ex-colega de assédio implacável.

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“Quando o artigo foi publicado, pensei: ‘Uau, estou muito grata por essa informação. Ela vai salvar muitas estudantes como eu de chegar perto dele e, portanto, evitar o risco de sofrer assédio!’ Quando o artigo foi tirado do ar, senti muita raiva. Mas entendi que há muitos homens no mundo acadêmico de quem eu e meus amigos e amigas não sabemos nada”, disse Sarkar ao HuffPost Índia.

Então, em 24 de outubro de 2017, ela publicou no Facebook o que viria a ser conhecido como LoSHA (sigla em inglês para lista de assediadores sexuais na academia). A lista de Sarkar, que foi aumentando conforme ela recebia informações de outras mulheres, chegou a 75 nomes, professores de cerca de 30 faculdades e universidades na Índia, no Reino Unido e nos Estados Unidos.

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Nos dias seguintes à publicação da LoSHA, a saúde mental de Sarkar sofreu um duro golpe, pois ela teve de proteger a identidade das mulheres que a procuraram. Apesar de um sólido sistema de apoio e acesso a serviços de saúde, ela entrou em depressão e engordou 20 quilos.

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Exatamente um ano depois, várias indianas driblaram o devido processo legal – ou seja, levar as acusações para os canais competentes – e decidiram denunciar quem as assediou nas redes sociais, às vezes guardando anonimato, outras vezes, não.

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Houve alguns resultados concretos: vários homens – jornalistas, publicitários, cineastas, artistas, atores e empreendedores – foram afastados, demitidos ou submetidos a investigações por causa das acusações feitas nas redes sociais.

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O HuffPost Índia procurou 23 universidades e faculdades para perguntar se eles tomaram alguma atitude em relação à lista de Sarkar. Perguntamos se foram realizadas investigações sobre as acusações ou se as instituições procuraram Sarkar para obter mais detalhes.

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O silêncio das instituições de ensino

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O HuffPost Índia enviou emails para as seguintes instituições:

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  • Universidade Jadavpur, Bengal Ocidental (10 nomes na lista)
  • Universidade Déli (9 nomes na lista)
  • Universidade Ambedkar (5 nomes na lista)
  • Film & Television Institute of India [FTII] (3 nomes na lista)
  • Satyajit Ray Film & Television Institute [SRFTI] (3 nomes na lista)
  • Universidade Hindu Banaras [BHU] (2 nomes na lista)
  • Universidade Jawaharlal Nehru (JNU)
  • IIT Bhubaneswar
  • Universidade DY Patil
  • Universidade Ashoka
  • Centro de Estudos de Ciências Sociais (CSSS), Kolkata
  • Instituto de Administração Rural [IRMA], Anand
  • Universidade St Xavier, Kolkata (2 nomes na lista)
  • TERI, Nova Déli
  • Universidade de Cambridge
  • TISS, Tuljapur
  • Universidade da Califórnia, Riverside
  • EFLU, Hyderabad
  • NLSIU, Bengaluru
  • Universidade MES Abasaheb Garware
  • Gurudas College, Kolkata
  • Escola de Comunicação Manipal
  • Universidade de Chicago

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O HuffPost Índia também ligou para os números de telefone listados nos sites das instituições que tinham os nomes de mais de um docente na “lista”.

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Das 23 instituições contatadas por email pelo HuffPost Índia, 21 não responderam.

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A diretora do CSSS, em Kolkata, disse que não houve investigação do professor mencionado na lista porque não houve reclamação formal contra ele.

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“Nossa política institucional não permite o reconhecimento ‘suo moto’ de acusações de assédio”, disse Rosinka Chaudhuri ao HuffPost Índia.

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Rutuja Shinde, advogado de Mumbai que oferece ajuda jurídica a sobreviventes que denunciaram assediadores nas redes sociais, disse ao HuffPost Índia que, na ausência de uma reclamação formal, as organizações ainda podem realizar investigações independentes, se tiverem conhecimento dos supostos casos de assédio.

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“Pode-se procurar provas que corroborem as acusações de assédio sexual. Na falta de uma reclamante, não haverá oportunidade de tomar seu depoimento. Mas o acusado pode apresentar outras evidências para se defender”, afirmou Shinde.

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Apesar de a lista ter sido muito comentada na imprensa indiana e internacional, e ter sido muito difundida via internet, Sarkar diz que nenhuma das instituições mencionadas a procurou para obter mais detalhes sobre as acusações que pesam contra seus docentes.

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“Teria ajudado, desde que contasse com o consentimento de quem fez a denúncia, é claro”, disse Sarkar. Em vários posts publicados depois da divulgação da lista, Raya anunciou que cooperaria com quaisquer investigações oficiais sobre a natureza das acusações descritas na lista.

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Alguns dos homens mencionados na lista de Sarkar como supostos assediadores foram declarados culpados em investigações realizadas com base em queixas formais. Gopal Balakrishnan, professor de história da Universidade da Califórnia, em Santa Cruz, foi considerado culpado por violar as políticas de assédio sexual da universidade. Ele havia sido denunciado por vários estudantes e colegas. A UCSC revelou o resultado da investigação em 25 de setembro passado, e Balakrishnan continua de licença, enquanto a instituição decide qual é a maneira adequada de puni-lo.

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Em março deste ano, Lawrence Liang, reitor da Universidade Ambedkar, em Nova Déli, foi considerado culpado de assediar sexualmente uma doutoranda de outra universidade. Liang foi suspenso de suas funções administrativas e está recorrendo da decisão na Suprema Corte de Déli.

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Sadanand Menon, professor adjunto no Asian College of Journalism (ACJ) – também mencionado na lista –, pediu demissão depois de ser acusado. O ACJ se recusou a demiti-lo porque a estudante que fez a acusação contra ele afirmou que Menon a assediou fora da faculdade, em um festival cultural liderado por ele. O presidente do ACJ, Shashi Kumar, disse aos jornalistas em maio que a instituição estava sendo alvejada por ser “liberal”.

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Descontente com a investigação do IIT Bhubaneshwar (mencionado na lista) sobre um professor acusado de assédio, a reclamante exigiu um segundo inquérito.

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Com exceção dessas instâncias em que as entidades agiram com base em queixas formais, não há evidências públicas de que as outras universidades tenham tomado medidas a respeito da lista de Sarkar.

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Ontem e hoje

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“Acho que uma diferença fundamental do que aconteceu ano passado e o que está acontecendo hoje é que as mulheres que me ajudaram a fazer a lista tinham medo de retaliação profissional, então preferiram o anonimato. Mas agora muitas delas estão superando esse medo e fazendo acusações publicamente”, disse Sarkar ao HuffPost Índia.

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Na onda #MeToo, houve muitos casos de acusações que partiram de contas anônimas, mas Sarkar diz ter sido procurada por cerca de 60 mulheres e que elas não usaram contas fake.

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“Elas usaram suas próprias contas de Facebook para falar comigo. Um número pequeno de mulheres entrou em contato por meio de amigas, para manter o anonimato, mas verifiquei os relatos com evidências adicionais e relatos de testemunhas”, acrescentou Sarkar.

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A nova onda do #MeToo na Índia normalizou a ideia de que o caminho da autoridades competentes é um fracasso, diz Sarkar.

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“Está mudando o discurso de ‘caça às bruxas’ – mas pessoas estão dispostas a descartar a ideia de que mulheres fazem acusações falsas só por vingança. Acho que também é um momento em que vai mudar a noção de que somente provas diretas têm credibilidade”, afirmou ela.

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Sarkar também diz que é importante não esquecer as mulheres que apoiaram a lista publicamente um ano atrás.

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“Elas não foram levadas a sério, foram acusadas de ajudar minha ‘caça às bruxas'”, diz Sarkar.

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Nesse momento de formação da segunda onda do #MeToo na Índia, no último mês, a ideia de “dar nome aos bois” foi vista com reservas, mas pouca gente expressou essa opinião publicamente. Houve conflitos nas redes sociais, mas eles não duraram muito tempo.

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“Se um grupo de mulheres se comporta de maneira a prejudicar outras mulheres, é importante lidar com essas queixas – é assim que você traz mais gente para o seu lado. Sou contra o feminismo simbólico branco porque ele prejudica mulheres não-brancas. Nossa prioridade deveria ser não deixar que essa ideologia molde os movimentos de libertação, porque ela significa a liberação de só algumas poucas mulheres”, disse Sarkar em relação às críticas a seu método.

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A ativista dos direitos das mulheres Kavita Krishnan recentemente atacou o site The Wirepor publicar um vídeo em que o jornalista Vinosh Dua, acusado de assédio pela cineasta Nishtha Jain, se defendeu e fez piada com o movimento #MeToo.

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Jain contou sua história no Facebook e depois foi procurada pelo The Wire..

 

Krishnan também tinha criticado a lista de Sarkar no ano passado. Hoje, apesar de se recusar a revisitar o debate sobre a lista, ela afirmou ao HuffPost Índia que nunca foi contra as mulheres que relatam seus traumas. Para Krishnan, é importante que haja mais detalhes além de simplesmente tornar público o nome do suposto assediador.

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ATUALIZAÇÃO:

A Universidade Ashoka respondeu ao HuffPost Índia e disse que foram criados quatro comitês para investigar as acusações de assédio contra um professor – que não foi considerado culpado de assédio sexual. A investigação foi realizada depois de a Universidade Ashoka ser contatada pela JNU. “Um total de quatro comitês investigaram o assunto, incluindo três na Ashoka e um na JNU. NENHUM dos comitês o considerou culpado de assédio sexual. Este é o veredicto de todos os comitês, e devemos respeitá-los”, disse Anjoo Mohun, diretor de comunicações da Universidade Ashoka, ao HuffPost Índia.

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*Este texto foi originalmente publicado no HuffPost Índia e traduzido do inglês.

 

 

 

 

 

 

 

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