Saiu no site O POVO
Veja publicação original: As possibilidades para melhorar a investigação do feminicídio
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Agentes da área da segurança pública e da sociedade civil dialogam possibilidades para melhorar a investigação do feminicídio e acelerar os processos até o julgamento
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As falhas no registro oficial dos casos de feminicídio indicam que o crime está no escuro. No dizer da Lei nº 13.104/2015, o feminicídio é um crime “contra a mulher por razões da condição do sexo feminino”. Violência doméstica e familiar, menosprezo ou discriminação à condição de mulher, baliza a legislação, configuram o feminicídio. Na realidade dos assassinatos de mulheres e na investigação deles, o feminicídio se torna mais complexo.
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Para Karen Benevides, do Fórum Cearense de Mulheres/Articulação de Mulheres Brasileiras (FMC/AMB), a Lei do Feminicídio representa “um avanço pequeno ainda porque é fruto de muita luta. O feminicídio é um crime do Estado porque são mortes evitáveis”. Ela reconhece uma melhoria na rede de proteção às vítimas de violência doméstica, mas atenta para a urgência em ajustar o foco sobre o feminicídio.
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Uma pesquisa do FMC/AMB, com “dados sistematizados pelo Comitê Cearense de Prevenção aos Homicídios na Adolescência” (da Assembleia Legislativa do Ceará), constata um grave crescimento nos homicídios de meninas e adolescentes – de dez a 19 anos – no Estado: de 27 assassinatos (2016) para 80 (2017) e 114 (2018). Na Capital, os índices também aumentaram: de seis (2016) para 31 (2017) e 58 (2018). Cada número guarda a história de uma morte que não foi bem contada, considera Karen Benevides.
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Nos dados oficiais que acessou para a pesquisa, ela encontrou apenas “a contagem das vítimas. E a tipificação é muito simples, não dá detalhes”. Outras fontes para o estudo foram “mídia, recortes de jornais, blogs, onde a gente conseguia”, mas as informações andavam em círculos. “Muitas vezes são considerados feminicídios quando a mulher é morta pelo parceiro. E temos uma tipificação de feminicídio quando fere o corpo da mulher e por gênero”, distingue Karen. Dessa forma ampliada, defende, o universo do tráfico de drogas, por exemplo, onde o gênero feminino é usado como moeda, também pode ser um indicador de feminicídio em crimes contra meninas e adolescentes.
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O feminicídio é “um crime muito maior” do que a classificação “passional”, dialoga Helena de Paula Frota, coordenadora do Observatório de Violência contra a Mulher/Universidade Estadual do Ceará (Observem/Uece). “Porque o homem se coloca numa posição hierárquica, que é proprietário de qualquer mulher”, entende.
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“O conceito está claro, a operacionalização é que não está efetiva”, completa Helena. Ela acredita que “muitos assassinatos” de mulheres não são tipificados como feminicídios por falhas na investigação: “Deve haver um inquérito muito pesquisado, completo. É preciso equipe só para se dedicar à elaboração dos inquéritos. Como não são bem elaborados, facilmente, a defesa desqualifica aquele caso como feminicídio”.
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Levantamentos do Observem/Uece, exemplifica Helena Frota, contam uma média de 250 a 300 assassinatos de mulheres, por ano, no Ceará; cerca de 75 são tipificados como feminicídio. A falta de uma identificação precisa reflete na subnotificação dos crimes. É a violência que não se vê. “A lei existe, mas precisa de procedimentos policiais e jurídicos. Aí é que se dá o número pequeno de feminicídios. A operacionalização requer formação, dinheiro, (pesquisa) em torno do feminicídio”, sublinha Helena.
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