HOME

Home

Importunação sexual é crime e estupro coletivo e corretivo têm penas ampliadas

Saiu no site: REVISTA MARIE CLAIRE

 

Veja publicação original:  Importunação sexual é crime e estupro coletivo e corretivo têm penas ampliadas

 

Promotora de Justiça, nossa colunista Gabriela Manssur escreve sobre a lei 13.718/2018, que prevê penas mais altas para quem comete estupro coletivo e estupro coletivo, além de penalizar a divulgação de imagens íntimas na internet

 

esta semana, nós, mulheres, tivemos motivos de sobra para comemorar. No último dia 24, foi sancionada uma lei que tanto esperávamos: a que criminaliza condutas antes esquecidas pelo legislador, além de alterar alguns artigos do Código Penal, tudo pertencente a um mesmo tema: crimes contra a dignidade sexual. Que bom que a sociedade, as instituições do Sistema de Justiça, Poderes Executivo e Legislativo entenderam que, quando se trata de nossa liberdade sexual, nossa imagem, nossa intimidade, não podemos ficar à margem da proteção legal.

E o aumento dos casos de violência contra a mulher na internet demonstra que não poderíamos mais esperar: quase 80% das vítimas de crimes virtuais são MULHERES. Comportamentos que vão desde o compartilhamento, transmissão, troca, divulgação e publicação de imagens com cenas de nudez, sexo e pornografia, sem o consentimento da mulher (e muitas vezes para dela se vingar, a famosa pornografia de revanche) agora são considerados crimes específicos. Caiu na rede, é peixe: pena de um a cinco anos de reclusão.

.

.
É fato que tivemos que assistir a casos graves e que causaram clamor público para chamarmos a atenção de que, como estava, não poderia continuar. Uma a cada quatro mulheres já sofreram assédio sexual nos transportes públicos, mas apenas 10% desses casos chegaram ao conhecimento das autoridades. Se o barulho que fizemos incomodou, despertou e deu causa a projetos de lei, vamos vibrar, conseguimos fazer do limão uma limonada. Agora, não há mais dúvidas: a “encochada”, o ato de ejacular no corpo da mulher, a “forçada de barra” a “passada” de mão, sem o CONSENTIMENTO da vitima, seja nas ruas, no transporte público ou onde quer que ela esteja, são condutas consideradas crime de importunação sexual: pena de um a cinco anos de reclusão. Não, é não! Respeita as mina!

.

.

Não podemos esquecer também do crime bárbaro publicado no Facebook para o mundo assistir: o estupro coletivo no Rio. Me recordo de um caso idêntico na mesma época, na cidade em que atuava como Promotora de Justiça criminal. Acompanhei a vítima por um longo período. Ela tentou o suicídio, sobreviveu, mas sua alma estava morta. Coube à Justiça devolver-lhe a dignidade e a esperança. E, para isso, precisamos de penas altas, proporcionais à gravidade desses crimes, para que nós, mulheres, nos lembremos do nosso valor, dos nossos direitos enquanto mulher e de que a culpa nunca é da vítima. Lamentei, na ocasião,  a falta de uma pena maior para punição dos agressores. A nova lei, acertadamente, traz essa inovação: estupro coletivo com pena mais alta que o estupro cometido por uma só pessoa.

.

.
E remetendo minha memória para a mesma cidade em que atuei entre 2012 e 2016, me lembrei da Larissa. Ela entrou na  minha sala no final do expediente, lá pelas 19h, cabisbaixa, abatida, muito magra, mas dava pra ver uma barriguinha saliente. Ela se sentou, aceitou um cafezinho e passamos a conversar. Num determinado momento perguntei: “O que posso fazer para te ajudar”?. “Me fala o que aconteceu comigo e o que a Justiça pode fazer”,  ela respondeu.

.
.

Diante do que  Larissa me contou, expliquei, não sem antes respirar fundo, chorar por dentro e pedir forças a Deus, que o que tinha ocorrido com ela era um caso de estupro corretivo.  Larissa, por ser lésbica (e virgem), foi “atacada” por um conhecido do bairro, que queria ensiná-la a “gostar de homem”. Desse estupro, veio a gravidez.

.

.
A Justiça fez sua parte. Larissa ainda não tinha superado o ocorrido, mas voltou para me dizer que ela e sua companheira estavam muito felizes com a chegada do bebê. Nunca mais esqueci esse caso. Então, para quem nunca ouviu essa expressão, e não sabe o seu significado, estupro corretivo é o ato de estuprar alguém, motivado pelo preconceito à orientação sexual dessa pessoa, como uma “lição”: “ensinar” lésbicas a “gostar de homem”, ou gays a “virar mulherzinha”.  É crime repugnante, incompreensível e inimaginável, mas  ocorre. Esse crime deve ser considerado gravíssimo. A Lei 13718/18 prevê essa novidade: estupro corretivo. Pra você, Larissa.

.

.

 

Por fim, uma alteração processual muito importante: não se exige mais representação  para nenhum crime sexual. Isso significa que as vítimas desses crimes não precisam mais voltar à delegacia para manifestar expressamente a vontade de processar o agressor, o estuprador, o  importunador sexual: o ônus e a responsabilidade saem dos ombros da mulher e passa  totalmente para o Ministério Publico, que é o titular da ação penal. Quem vai processar o agressor nesses casos?  Promotoras e Promotores de Justiça, se convencidos dos fatos.

.

.
Há algum tempo, bato na tecla de que a violação da liberdade e da dignidade sexual da mulher não é questão pessoal, que deve ficar na esfera privada, mas, sim, de ordem pública e de segurança de toda a sociedade -vide o alto número de crimes dessa natureza ocorridos no Brasil, e que nem de longe corresponde ao número de casos que chegam à Justiça. O Estado tem que meter a colher.

.

.
Parabéns a todas e todos envolvidos na aprovação  da Lei 13.718/2018, entre os quais me incluo: um marco legislativo histórico para as meninas e mulheres de todo o Brasil. Se você é mulher e quer conquistar o mundo, lembre-se:  representamos mais de 50% da população, queremos respeito, proteção e dignidade. O futuro é feminino e está nas nossas mãos.

.

.

.

 

 

 

 

…..

 

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Compartilhe

Compartilhar no facebook
Facebook
Compartilhar no twitter
Twitter
Compartilhar no linkedin
LinkedIn

HOME