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“Em casa, futebol sempre foi coisa de mulher”

Saiu no site AZ MINA

 

Veja publicação original:   “Em casa, futebol sempre foi coisa de mulher”

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“Minhas memórias de esporte sempre me remetem à minha mãe e minha avó”, conta a boleira Ana Paula, quem senta no Divã hoje
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Quem senta no divã d’AzMina essa semana é a jornalista e futeboleira amadora Ana Paula Camargo

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Ana e a mãe, Maria Cecília, no jogo Argentina x Bélgica, em Brasília, na Copa do Mundo de 2014 (Foto: Arquivo pessoal)

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Boleira que sou, decidi completar, pela primeira vez, o álbum da Copa do Mundo de Futebol Feminino. Há alguns dias, fui até uma banca de jornal atrás das figurinhas. Chegando lá, me animo ao ver algumas crianças trocando figurinhas no chão, mas logo vejo uma placa pendurada na entrada: troque aqui as figurinhas da Copa América. Copa do Mundo é maior que Copa América, certo? Chateada pelo tratamento desigual entre as competições, minha mãe logo diz à dona da banca: por que não promover a troca de figurinhas para o álbum feminino?

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Essa situação me levou imediatamente para o ano de 1994. A verdade é que eu sempre fui uma menina privilegiada em muitos sentidos. E não foi diferente com o esporte: em casa, futebol é coisa de mulher. Minhas memórias da noite do tetracampeonato masculino de futebol – fora o pênalti do Baggio – são de duas figuras centrais da minha vida: minha vó Aracy e minha mãe Maria Cecília.

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Lembro como se fosse hoje das figas que minha avó fazia com as mãos durante a cobrança das penalidades e de minha mãe se esconder na garagem para não ver os pênaltis. Eu, aos 10 anos, saía e entrava em casa para narrar cada cobrança para ela. O fato é que na copa do tetra, as protagonistas foram elas, e não eles.

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Times diferentes, paixão igual

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Minha avó era uma esportista nata. Acordava antes do nascer do sol para ir nadar no mar de Ubatuba e até teve a sorte de nadar no Rio Tietê quando este ainda era vivo. Corintiana tão apaixonada quanto, orgulhava-se ao me ver, ainda pequena, entoando o hino do time e declamando trechos de um livro escrito por um jornalista sobre o Corinthians.

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Minha mãe, por sua vez, é uma santista também apaixonada, o que nos levou a algumas discussões alguns anos atrás. Times diferentes, mas passionais na mesma medida quando se trata de esporte e torcida. Ela é a pessoa que mais vê e mais sabe sobre futebol neste mundo. Ninguém nos segura quando assistimos e vemos jogos juntas, pois é um ambiente de amor pleno.

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Ana e a vó Aracy, de quem herdou a paixão pelo esporte e pelo Corinthians (Arquivo pessoal)

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Essa sintonia com o esporte trouxe uma cumplicidade entre estas três gerações da família. Quando meu time ganha, eu penso na minha avó e no quanto ela estaria feliz. Quando eu quero a opinião sobre algum time ou atleta, eu pergunto para minha mãe. Quando eu faço uma assistência para o gol de uma amiga no meu indispensável futebol de toda segunda-feira, certamente carrego ali um pouco das duas, que sempre me incentivaram a jogar e a gostar de futebol.

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Falar sobre e jogar futebol ainda é resistência

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Eu gostaria de ter essas lembranças de infância e adolescência recheadas por jogos da seleção feminina de futebol. Embora eu soubesse quem eram Sissi, Pretinha, Roseli e cia, não havia espaço para elas na TV. O futebol feminino estava na minha casa, mas não estava na TV e no rádio.

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Hoje, a Copa do Mundo de Futebol Feminino está finalmente começando a ocupar publicamente o espaço que sempre ocupou no meu dia a dia, com as partidas sendo transmitidas em canais abertos e fechados, o que me dá a possibilidade de criar novas memórias futebolísticas com a minha mãe (e também com a minha avó, que segue comigo no time e no coração).

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Ainda hoje, para as mulheres, falar e jogar futebol é um ato de resistência. É ter que se posicionar a cada “nossa, mas você sabe jogar?” ou um “nossa, mas você conversa sobre futebol de igual para igual com homens?”.

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Neste mês, é a nossa vez de jogar e falar sobre a Copa. É nossa vez de sermos protagonistas – num álbum de figurinhas ou numa roda de conversas. Ou naqueles almoços de família na casa da avó, dos quais eu sinto falta todo domingo.

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Não sou mais menina, mas continuo indo e voltando para contar para minha mãe sobre cobrança de pênaltis, pois ela segue sem conseguir ver.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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