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Como Aretha Franklin transformou uma música sexista em hino feminista

Saiu no site G1: 

 

Veja publicação original: Como Aretha Franklin transformou uma música sexista em hino feminista

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Uma das gravações mais influentes na história do R&B, a música ‘Respect’ sofreu uma radical mudança na voz de Aretha Franklin.

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Uma das gravações mais influentes na história do R&B, a música “Respect” sofreu uma radical mudança na voz de Aretha Franklin: gozava de sucesso modesto quando foi lançada e, depois da “rainha do soul”, transformou-se em um hino do feminismo e da luta por direitos civis nos Estados Unidos.

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Mas Respect nem sempre foi uma música reconhecida apenas na voz da cantora, que morreu de câncer no pâncreas nesta quinta-feria, aos 76 anos.

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Alguns trechos da música não existiam na versão original de Otis Redding, de 1965, como a parte em que Aretha soletra a palavra “respect” (respeito, em inglês).

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Na verdade, na versão original, a mensagem da letra significava justamente o contrário do que ficou conhecida com a diva.

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Na voz de Redding, a letra conta a história de um trabalhador homem que, ao chegar em sua casa, pede que sua mulher “ingrata” se submeta a ele, implorando por gratidão e, possivelmente, até por sexo em troca do sustento da família garantido por ele.

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A letra original diz, em inglês: “Hey, little girl, you are sweeter than honey / And I’m about to give you all my money / But all I want you to do / Is just give it, give it / Respect when I come home, hey hey now / Hey hey hey, yeah now.”

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(em tradução livre, ficaria assim: Hey, garota, você é mais doce que mel / E estou a ponto de te dar todo meu dinheiro / E tudo que eu te peço é que você me dê / Respeito quando chego em casa”)

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Redding escreveu a letra quando sua carreira começava a deslanchar, durante uma turnê pelos Estados Unidos. Ele era tido como uma das mais talentosas promessas do soul. O cantor, mais conhecido por sua música (Sitting on) The Dock of the Bay, lançada postumamente, colocou Respect em seu terceiro álbum, Otis Blue.

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A música fez certo barulho, chegando à posição 35 nas paradas de sucesso de novembro de 1965, segundo a “Billboard”.

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A resposta de uma mulher

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Mas o sucesso inicial da música não chegou nem perto do que viria a seguir. Em fevereiro de 1967, Aretha, uma pouco conhecida cantora gospel de Detroit, chegou ao estúdio Atlantic Record, em Nova York, e gravou sua versão de Respect.

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Filha de um pastor batista, a cantora já havia gravado vários álbuns quando tinha apenas 25 anos – nenhum deles, no entanto, teve reconhecimento proporcional ao seu talento.

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A tentativa de dar um salto na carreira culminou com uma gravação bem diferente da versão original de Respect, de Redding. Ela acrescentou vocais, novos versos à letra e uma mensagem completamente diferente da música original.

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A voz de Aretha é forte: não implora nem pede nada e, de forma assertiva, demonstra que é uma mulher que tem controle sobre sua própria vida. Ela desafia o sexismo enquanto evoca uma relação entre iguais, num tom que funciona quase como uma reposta ao compositor original.

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A revista “Rolling Stone” classificou a versão de Aretha como uma das cinco melhores músicas de todos os tempos. A publicação escreveu: “Aretha Franklin não está pedindo nada. Ela canta com superioridade moral: uma mulher clamando pelo fim do esgotamento e do sacrifício de uma relação injusta com uma autoridade abrasadora”.

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A letra dela diz:

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“Não vou cometer o mesmo erro quando você for embora / Não vou errar, porque eu não quero / Tudo que estou pedindo / é um pouco de respeito quando você chegar em casa (só um pouquinho) / Estou a ponto de te dar todo meu dinheiro / E tudo que eu te peço é um retorno, querido / O que é meu por direito / Quando você chegar em casa”

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(No original: “I ain’t gonna do you wrong while you’re gone / Ain’t gonna do you wrong cause I don’t wanna / All I’m askin’ / Is for a little respect when you come home (just a little bit) / I’m about to give you all of my money / And all I’m askin’ in return, honey / Is to give me my profits / When you get home”)

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Rainha do soul

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Em meados da década de 1960, a música atingiu em cheio os Estados Unidos, em um momento em que o país estava imerso em tensão e na energia que vinha dos movimentos pelos direitos civis. O movimento negro em particular viu na música de Aretha Franklin uma declaração contra a opressão e pelo empoderamento feminino.

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A versão chegou ao topo da parada da Billboard em junho 1968 e permanceu na liderança por três semanas.

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O sucesso levou a cantora a gravar, em 1968, o álbum Lady of Soul – até hoje considerado uma obra-prima. A gravação acabou rendendo à cantora o apelido pelo qual é conhecida até hoje: “rainha do soul”.

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“Eu não imaginava que minhas músicas se tornariam hinos para as mulheres. Mas estou muito feliz”, disse ela à revista “Time” em setembro de 2017.

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“As mulheres provavelmente sentem compaixão e se identificam com a letra. Todos nós podemos aprender um pouco um com o outro, então é ótimo quando as pessoas se inspiram com minhas músicas”, disse.

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Recriação

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Victoria Malawey, chefe do departamento de música na Macalester College, em St. Paul, Minnesota, diz que Aretha Franklin não deu a Respect apenas um novo significado.

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Sua versão apresenta “mudanças no conteúdo melódico e vocal, e também na forma e na letra” quando comparada com a original, diz Malaney.

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Em um artigo de 2014, Malaway pontuou que as mudanças de ritmo, vocais e adição de uma nova letra formaram uma “poderosa resposta à versão orginal de Redding”.

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O estudo mostra que essas alterações imprimiram uma “reedição de gênero” à música, associando a letra a um significado “cultural e político mais amplo.”

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“A dimensão de sua ‘reautoria’ garante a Aretha um status de dona da música”, escreve Malaway.

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Em 1967, o próprio Redding reconheceu esse fato durante o Monterey Pop Festival. “A próxima música é uma canção que uma garota tirou de mim”, disse ao público. “Uma grande amiga minha. Essa moça pegou a canção para ela, mas vou cantá-la mesmo assim”, disse, antes de tocar a versão original de Respect.

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‘Carreira exuberante’

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Respect é apenas uma entre várias músicas imortalizadas na voz de Aretha Franklin, como I Say a Little Prayer (1968) e (You Make Me Feel Like) A Natural Woman (1967).

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Em sete décadas de carreira, ela alcançou o topo das paradas americanas com mais de 20 músicas.

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Também ganhou o Grammy como melhor performance de R&B por oito anos consecutivos, entre 1968 e 1975.

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Foi a primeira mulher incluída no Hall da Fama do Rock and Roll e também ganhou a Medalha Presidencial da Liberdade do presidente George W. Bush, em 2005, quando foi elogiada por “ganhar os corações de milhões de americanos”.

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Dez anos depois, levou o presidente Barack Obama às lágrimas quando cantou (You Make Me Feel Like) A Natural Woman no Kennedy Center – tendo antes cantado na cerimônia de posse do primeiro presidente negro dos EUA, em 2009.

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Ela se aposentou em 2017, dizendo se sentir “exuberante” ao finalmente desligar as luzes do palco.

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