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“Prêmio deve ser igual, riscos são os mesmos”, diz surfista de ondas grande

Saiu no site UNIVERSA

 

Veja publicação original:  “Prêmio deve ser igual, riscos são os mesmos”, diz surfista de ondas grande

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Por Débora Miranda

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Depois de viver até os seis anos no Guarujá, Nicole Pacelli foi levada pela família para morar em São Paulo. A cidade fez com que ela, literalmente, se sentisse um peixe fora d’água. Nicole só queria saber de voltar para perto do mar e sonhava em ser surfista profissional.

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Mais tarde, acabou cedendo às pressões dos pais para cursar uma faculdade, mas, no último ano, trancou. Estava decidida a ir para o Havaí, onde acabou se sagrando campeã mundial de stand-up paddle.

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“Foi em 2013, ano em que começou o circuito feminino de stand-up. Eu estava iniciando o quarto ano do curso de educação física. Falei: ‘Ah, não. Agora é a minha hora, vou correr esse circuito’. Aí acabei trancando a faculdade… Na verdade, eu larguei mesmo”, lembra, rindo.

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Antes disso, no entanto, Nicole foi preparando seu caminho. Com o pai, que também é surfista, aprendeu o fascínio pelas ondas grandes e a tranquilidade ao encará-las. “Eu sempre tive medo. Mas ter medo e ficar apavorada ou desesperada são coisas diferentes. O medo é bom, faz você pensar”, diz ela, que também surfa sem o remo.

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Quando ainda não havia competição feminina, disputou lado a lado com os homens. E, atualmente, celebra a decisão da WSL (World Surf League) de pagar premiação igual a homens e mulheres em todos os campeonatos.

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“Todo o mundo adorou. Tem muita mulher aí representando, surfando nos mesmos mares que os homens. Nas ondas grandes, ainda corremos os mesmos riscos. Então, foi uma decisão muito bem-aceita, porque todo o mundo viu que foi justo.”

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Leia, abaixo, trechos da entrevista ao Extraordinárias.

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Universa: Quais foram as maiores dificuldades que você enfrentou quando decidiu que queria ser esportista?

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Nicole: Eu fiquei bem em dúvida um tempão, porque eu vivia em São Paulo. Meus pais são surfistas, e eu havia morado no Guarujá até os seis anos. Sempre gostei de surfar, mas era muito difícil imaginar que seria surfista profissional morando em São Paulo. Era quase impossível. Aí eu acabei entrando na faculdade, escolhi educação física, que tinha a ver com surfe. Quando eu entrei na USP, pedi: “Pô, mãe, entrei, agora deixa eu viajar”. Eu nunca tinha feito uma viagem para surfar na vida e, na época, eu já tinha um patrocínio –pequeno, mas eu tinha–, por causa do stand-up. Era um esporte supernovo no Brasil. Aí fui para o Havaí e lá eu me encontrei.

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Quando você descobriu o stand-up?

Eu comecei tinha uns 16, 17 anos. Meu pai trouxe uma prancha da Califórnia, um tempão atrás, era uma prancha bem grande e com remo. Ele me desafiava, e eu acabei conseguindo surfar nela. Para mim era uma diversão! Mas fui me apaixonado e, depois de um tempo, meu pai fez uma prancha de stand-up aqui no Brasil, foi o primeiro. E aí eu comecei a surfar. No começo as pessoas nem sabiam o que era, só tinha eu no mar com remo. Aí comecei a correr uns campeonatos, mas, no começo, não tinha feminino, então eu disputava com os homens.

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Como era competir com os homens?

Aconteceu isso no Mundial de 2012, no Havaí. Era um lugar em que eu surfava sempre de stand-up e, como eu já estava familiarizada com a onda, quis correr. Aí eu cheguei para o organizador e pedi. O cara não me conhecia, ninguém me conhecia na época. Ele falou: “Você tem certeza?”. Eu disse que sim. Ele me colocou na triagem, que é uma seletiva para entrar no evento principal. Quando chegou o dia, o mar estava gigante e bem torto. Eu entrei, peguei uma onda muito boa e não consegui ir para o fundo mais.

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E aí o que você fez?

Tomei várias ondas na cabeça. Mas na hora em que cheguei na areia, vieram vários atletas que eu admirava na época falar comigo e me parabenizar. Isso fez meu dia. Eu falei: “Caramba, estou no caminho certo! Então vou continuar treinando”. E aí, no ano seguinte, começou o circuito feminino de stand-up. Eu estava iniciando o quarto ano do curso de educação física. Falei: ‘Ah, não. Agora é a minha hora, vou correr esse circuito’. Aí acabei trancando a faculdade… Na verdade eu larguei mesmo. E acabei sendo campeã mundial.

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E esse fascínio pelas ondas gigantes?

Meu pai é surfista de ondas grandes, e ele sempre me passou uma calma muito grande dentro do mar. Quando eu fui para o Havaí pela primeira vez, estava com ele e fomos direto para Mauí, que é a ilha que tem o campeonato da WSL hoje em dia, onde fica Jaws. Meu pai já surfava em Jaws e sempre voltava contando histórias de lá. Eu lembro que pegar uma onda lá foi uma das melhores sensações que eu tinha tido na vida. E eu comecei a gostar muito de ondas grandes. É um surfe diferente, em que você precisa ter mais respeito. Precisa ter seu tempo, esperar, olhar bem, sem afobação. E eu queria muito surfar Jaws de stand-up também, o que fiz em 2014. Eu fui a primeira mulher a pegar uma onda de stand-up lá.

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Você nunca sente medo?

Ah, eu tenho medo, na verdade. Eu sempre tive medo. Mas ter medo e ficar apavorada ou desesperada são coisas diferentes. Eu sempre tive medo, mas o medo é bom, acho que me faz pensar melhor, analisar bem a situação. ‘Esse mar está grande. Onde eu vou entrar? Se a onda quebrar na minha frente, eu consigo tomar na cabeça? Eu vou ficar bem? Se eu perder a prancha, eu consigo sair nadando?’ Acho que geralmente, quando você está muito confiante é que as coisas dão errado. O mar te faz ficar mais humilde, ele te bota no seu lugar.

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A WSL foi a primeira organização de esporte internacional a equiparar os prêmios entre homens e mulheres. Como essa decisão foi recebida?

Pelo que vi, todo o mundo adorou, tanto os homens quanto as mulheres. Tem muita mulher aí representando, surfando nos mesmos mares que os homens. Nas ondas grandes, ainda corremos os mesmos riscos. Então, foi uma decisão muito bem-aceita, porque todo o mundo viu que foi justo. E serviu de exemplo para várias outras modalidades e várias outras organizações, que estão adotando ‘equal pay’. É bom também porque dá maior visibilidade para o surfe. Foi muito bom para o esporte.

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O que você diz para as pessoas que querem viver do esporte e, como aconteceu com você, têm dúvidas e inseguranças?

Acho que tem que tentar, mesmo sendo um caminho meio incerto. Senão, você vai se lamentar a vida inteira. Mas tem que ir atrás também, tem que treinar. Nada vai cair do céu. E eu acho que é por isso que meus pais também não queriam que eu deixasse a faculdade. Ninguém quer que o filho quebre a cara, quer sempre o caminho mais seguro. E o esporte não é mesmo um caminho tão seguro. Mas se você quer muito, tem que confiar e ir atrás. Só a gente mesmo pode ir atrás dos nossos sonhos.

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