HOME

Home

Ksenia Sobchak: Uma mulher no Kremlin

Saiu no site REVISTA MARIE CLAIRE:

 

Veja publicação original: Ksenia Sobchak: Uma mulher no Kremlin

.

Por Anna Nemtsova

.

Ela foi apresentadora de TV, estrela de cinema e sex symbol. Com um discurso progressista, a jornalista e socialite Ksenia Sobchak decidiu enfrentar Vladmir Putin nas últimas eleições russas, em março passado. Em uma campanha cercada de especulações e mistério, chamou atenção para a causa LGBTQ e criticou as prisões políticas em seu país – que está nos holofotes este mês porque sediará a Copa do Mundo. Um ato carregado não só de ousadia, mas de coragem

.

Numa noite fria de março do ano passado, a elite da moda aproveitou o fim dos desfiles da temporada de inverno em Paris para brindar os 35 anos da top russa Natalia Vodianova. Com temática de cabaré e dress code vermelho, a festa seguia sua toada natural: Anna Wintour, a todo-poderosa das publicações de moda, papeava com os fotógrafos Mario Testino e Patrick Demarchelier, enquanto se formavam outras rodas em torno da atriz Sienna Miller e da estilista Diane von Furstenberg. Não longe dali, o designer de sapatos-desejo Christian Louboutin ensaiava sair à francesa, arrematando as devidas atenções das it girls russas, suas clientes fiéis. Entre elas, uma editora de moda com maquiagem suave e cabelos loiros nos ombros desnudos pelo vestido assimétrico comia batata frita, exibindo as unhas intercaladas por esmalte vermelho e branco, punhos e orelhas cravados de diamantes, sorriso simpático. Os desavisados mal podiam imaginar: estavam diante daquela que iria desafiar o poder na Federação Russa.

.

Na última corrida presidencial, Ksenia Sobchak lançou-se candidata. Foi derrotada pelo presidente-czar Vladimir Putin, que se elegeu com 76% dos votos e permanecerá mais seis anos no poder (ele já governa há 18). Ksenia teve menos de 2% dos votos, mas, graças ao trabalho de campanha, seus ideais se propagam no ar. Defensora dos direitos LGBTQ (na Rússia, casais homoafetivos não podem casar nem adotar crianças e há militantes presos por promover debates sobre o tema) e crítica feroz das prisões políticas, ela sacudiu os pilares conservadores e se firmou como uma liderança política progressista.

.

Kremlin (Foto: Getty Images / Alamy Stock)

.

.

.

Boneca russa

.

Filha do primeiro prefeito eleito de São Petersburgo, Anatoli Sobtchak (acusado de corrupção no fim do mandato), e da senadora Lyudmila Narusova, Ksenia teve a vida recheada de dramas dostoievskianos, tipo envenenamentos misteriosos e investigações policiais. Seu pai, que teria ligações com a polícia secreta do governo, a KGB, foi encontrado morto em um hotel no ano 2000. Ao mesmo tempo, sua biografia contempla atributos pouco revolucionários, como desfiles de grifes e festas que reúnem o jet set mundial  – basta espiar o Instagram dela, com 5,6 milhões de seguidores, regado a champanhe, selfies em jatinhos, vestidos de alta-costura e celebridades, para entender por que atende pelo apelido de Paris Hilton de Moscou.

.

.

Kremlin (Foto: Getty Images)

.

Ksenia estudou nas melhores escolas e faculdades de São Petersburgo, onde praticava balé. Formou-se em política e ficou conhecida em 2004, aos 23 anos, quando virou apresentadora do reality show Dom-2, a versão russa do Big Brother. Carismática e incisiva, angariou fãs e críticos de cara. Graças ao estrelato, criou uma linha de roupas, outra de sapatos, abriu um restaurante, apresentou um talk show (vestida sempre com um figurino rosa com ares de Xuxa), foi parar na capa da Playboy. Estrelou um filme sobre sua infância e deu declarações um tanto chocantes, como: “Conhecer a Serra Nevada, na Espanha, foi como fazer sexo com camisinha, como fazer sexo com uma prostituta – muito racional, muito chato”. Em parceria com a oligarca russa Oksana Robsky, lançou um perfume e um livro chamados Como Casar com um Milionário – na capa, ela e Oksana usavam minivestidos de noiva com cintas-liga e empunhavam metralhadoras. Hoje mais sóbria, edita uma das principais revistas de moda no país e está entre as celebridades mais bem pagas da Rússia. Aos 30, seu patrimônio era de US$ 3 milhões. “Ksenia sempre tenta transformar em projetos pessoais as oportunidades que aparecem. E, quando a coisa a excita, se entrega por inteiro”, diz o produtor de TV Mikhail Zygar.

.

 

Kremlin (Foto: Reprodução)

.

Na condição de celebridade, foi convidada, em 2011, a participar de protestos contra o resultado das eleições presidenciais daquele ano, tidas como fraudulentas e que elegeram Vladimir Putin pela terceira vez. Os manifestantes apostaram na popularidade dela para fortalecer o movimento que levou milhares de pessoas às ruas de Moscou. Ksenia fez coro no comício anti-Putin ombro a ombro com ativistas que acabaram presos. Foi vaiada e ouviu críticas pesadas a seu sobrenome. Mas tomou gosto pelo palanque.

.

Foi nesse momento que se consolidou como uma forte opositora ao governo. Ali também assumiu um relacionamento com o ativista Ilya Yashin, um dos mais radicais da Rússia (naquele ano, oito homens invadiram o apartamento dela, a agrediram e chamaram o namorado de “baderneiro”, além de roubarem milhares de euros). No ano seguinte, em 2012, estreou na MTV Rússia o programa de entrevistas políticas e temáticas sociais chamado Departamento de Estado – que, por pressões do governo, foi cancelado após a primeira edição. Numa ocasião, quando a entrevistaram sobre seu possível début como política, Ksenia declarou sua admiração pela “poderosa Dama de Ferro” Margaret Thatcher. E emendou: “E eu tenho bolas de ferro”.

.

.

Kremlin (Foto: Reprodução Instagram)

.

Em outubro passado, lançou-se oficialmente candidata à Presidência, o que gerou especulações em todos os campos ideológicos. Primeiro, cogitou-se a possibilidade de que Ksenia era, na verdade, um fantoche de Putin. Ela seria afilhada do governante (há uma foto dela aos 12 anos com os pais e o presidente) porque seu pai era um aliado político e teria empregado um alto funcionário da KGB como vice durante seu mandato. Na outra ponta do espectro, levantou-se a hipótese de ele ter sido executado justamente por saber demais. Fiéis dessa corrente de pensamento, julgaram a candidatura de Ksenia corajosa, já que pelo menos 11 líderes da oposição podem ter sido assassinados nas últimas duas décadas. Questionada sobre as teorias conspiratórias, ela desconversa: “Sou a responsável por minhas armas e ações”, afirmou recentemente.

.

Durante a campanha, ela cruzou a Rússia. No fim de janeiro, Marie Claire juntou-se a ela na cidade de Vladimir, a quase 200 quilômetros de Moscou. De salto alto dourado e casaco preto, Ksenia, que é casada com o ator Maksim Vitorgan e mãe de Platon, de 1 ano, listou a um auditório lotado de estudantes os fracassos de Putin. Responsabilizou-o pela economia decadente, os negócios empacados pelo Kremlin, a corrupção e o estigma de criminoso empunhado pelo povo russo. “Sou uma patriota, mas a maioria das coisas de que me orgulho na Rússia não tem nada a ver com Putin”, disse.

.

Até o final de seu quarto mandato, Putin terá completado 71 anos, e a probabilidade de aposentadoria é alta. Mas ainda precisa encontrar um sucessor. “Eu não ficaria surpresa se Putin a elegesse ministra ou governadora”, afirma Tatyana Felgenhauer, uma célebre articulista política da rádio russa. “Me surpreenderia sua recusa. E aí eu passaria a respeitá-la”, diz ela, que sobreviveu a um ataque a facadas no ano passado. Quando Marie Claire questiona Ksenia sobre se sente medo da postura e da posição que hoje reforça mais que nunca, ela nega. Insiste que está apenas no começo de uma promissora carreira política. “Não considero o medo aceitável. Podem me acusar de qualquer coisa, mas não de ser uma covarde.”

 

 

 

 

.

.

.

.

.

.

.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Compartilhe

Compartilhar no facebook
Facebook
Compartilhar no twitter
Twitter
Compartilhar no linkedin
LinkedIn

HOME