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Em ocupação gerida por duas mulheres, bem-estar de 26 crianças é prioridade

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Veja publicação original: Em ocupação gerida por duas mulheres, bem-estar de 26 crianças é prioridade

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Por Helena Bertho

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Sentados em carteiras de plástico, com cadernos em mãos, oito adolescentes e duas adultas debatem com a professora os possíveis temas da redação do ENEM deste ano. “Direito à moradia pode ser um deles”, diz ela. E completa: “E daí vocês têm muitas chances, porque isso faz parte da vivência daqui, né?”.

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A aula acontece no topo do desativado Colégio Butantã, na zona oeste de São Paulo, um prédio de quatro andares que, em 2016, foi ocupado por 30 famílias. Elas fundaram ali a Ocupação Independente Aqualtune. Segundo a tradição, esse era o nome da avó materna de Zumbi dos Palmares, uma princesa africana.

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As antigas salas de aula viraram casas, mas o último piso guarda a atmosfera de uma escola. Acontecem ali, além de um cursinho pré-vestibular popular, atividades psicopedagógicas, aulas de teatro e reforço para as 26 crianças que vivem ali.

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 Aline e Karina são as coordenadoras da ocupaçãoImagem: UOL

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“Meus filhos nunca foram ao cinema; a maioria aqui nunca foi. Então, a gente tenta ajudar a melhorar a vida deles com outras atividades”, diz Aline da Silva, cuidadora de idosos que, ao lado da amiga Karina Holanda, porteira, lidera a ocupação. Aline tem sete filhos, Karina, nenhum, e ambas são solteiras. Os adultos que trabalham no prédio são todos voluntários.

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Mãe de sete 

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Quatros dos filhos de Aline ainda moram na ocupação. Um deles, do par de gêmeos de 16 anos, tem esquizofrenia e autismo (o outro irmão, cujo quadro de saúde é mais delicado, mora com os avós). Com a mãe, vivem ainda duas meninas de 11 e 14 anos. O pai deles todos faleceu.

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A família de Aline vive em ocupações há seis anos. “Morava no Centro de São Paulo, mas não consegui mais pagar o aluguel. Era ele ou a comida. Daí, uma amiga disse que ia ocupar um prédio. Peguei minhas coisas, uma filha no colo e fui”, conta. Desde então, calcula em nove o número de reintegração de posses e mudanças pelas quais já passou. Entre as muitas dificuldades que essa dinâmica acarreta, as que pesam nas crianças são as mais doídas para ela.

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“Às vezes eu fico pensando: ‘caramba, por que eu tive tantos filhos?’. Minha preocupação não é tanto onde eu moro, mas a incerteza de um dia estar aqui e outro não. Isso faz com que as crianças tenham que mudar de escola com frequência”.

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Preconceito na escola

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A maior parte das crianças da ocupação estuda na mesma escola pública, perto de casa. Elas costumam relatar aos pais e às coordenadoras da “ocupa” situações de preconceito.

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“Têm colegas que não quererem brincar com eles, porque dizem que eles têm piolho. Também já chamaram minha filha de ‘neguinha do Borel’. Dia desses, uma das mães daqui pegou o filho cortando o cabelo, porque faziam piada, dizendo que era “cabelo de Miojo”, conta Aline.

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Coordenadoras e mães já foram reclamar na escola, mas, dizem, nenhuma mudança aconteceu. Elas atribuem o descaso ao fato de morarem numa ocupação.

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Teatro, excursão e vestibular

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 Aula no cursinho popular da ocupaçãoImagem: UOL

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As crianças recebem visitas de voluntários para brincar, assistem, de vez em quando, peças da companhia de teatro Cia. de Galochas, e fazem passeios e excursões. Em datas especiais, as líderes fazem um “corre” para armar festinhas e comprar presentes.

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Esse ano, começou também a operar ali um cursinho popular. Ele é aberto para outros jovens e adultos da região. Karina e Aline frequentam as aulas. Karina, que cuida da portaria da ocupação, quer fazer Ciências Sociais. Já Aline, pretender prestar vestibular para Direito. Ela frequenta ainda um curso técnico de cuidador.

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Reintegração de posse e negociações

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Os moradores da Aqualtune estão na expectativa de que uma defensora pública e duas advogadas voluntárias consigam reverter a reintegração de posse autorizada pela justiça no início do ano. Paralelamente, tentam negociar com a Secretaria de Habitação a permanência definitiva no prédio.

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“Essa espera é angustiante. As pessoas não olham pra gente. E as crianças são as maiores vítimas”, diz Aline.

 

 

 

 

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