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Elas contra-atacaram o machismo dentro do trabalho e contam o que aconteceu

Saiu no site UNIVERSA:

 

Veja publicação original: Elas contra-atacaram o machismo dentro do trabalho e contam o que aconteceu

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Por Letícia Rós e Marina Oliveira

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Estas quatro mulheres não ficaram caladas quando foram atacadas por homens machistas no trabalho: elas confrontaram empresa e assediadores e defendem que reagir, apesar das consequências, é o melhor que podemos fazer. Leia as histórias a seguir:

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“Em um evento de final de ano da empresa, eu fiz a queixa ao gerente da companhia”

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Arquivo pessoal
 Imagem: Arquivo pessoal

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“Eu trabalhei em um centro de processamento de dados sendo a única mulher entre seis funcionários. Eu ganhava menos, não podia participar dos plantões para ganhar extra –só ficavam os homens por ‘segurança’– e eu tinha o meu trabalho questionado o tempo todo. Qualquer erro que aparecesse, já cogitavam meu nome como autora, antes de todo o resto. Até dos cursos eu era excluída, eu pagava os meus do próprio bolso.

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Então, em um evento de final de ano da empresa, eu fiz a queixa ao gerente da companhia. Um colega me apoiou e confirmou a minha versão. Pareceu que ele me ouviu e, dias depois, as coisas pareciam estar melhores para mim. Mas era só impressão. Eu comecei a ser excluída da equipe (eles se calavam quando eu chegava), fui apontada por falhas que não cometi e pequenos deslizes não eram mais tolerados –fui mandada embora para casa porque cheguei 15 minutos atrasadas para cobrir um turno que não era meu.

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Foram quatro anos vivendo isso. Até que o tal gerente foi demitido e entrou outro, com uma postura totalmente diferente. Percebi que o sexismo era do chefe e não da empresa. Fiquei mais três anos lá, com essa nova política de gerenciamento. Entendo que algumas coisas são difíceis de mudar, mas nunca me conformei em ser tratada diferente por ser mulher, sempre contestei.

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É duro enfrentar as consequências de quando você reage e denuncia, mas não existe nada pior do que se calar e dar força para esse movimento. Se não começarmos a reclamar, a exigir nosso lugar ao sol, estaremos compactuando com a permanência da mulher em segundo plano.”

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(Angela Cristina Carneiro Muniz, 41, administradora)

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“Eu fiquei muito brava com a cantada, a ponto de colocar dedo na cara dele e responder”

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Arquivo pessoal
 Imagem: Arquivo pessoal

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“Há 15 anos, eu sou cantora profissional. Há 11, professora de canto. Esse episódio aconteceu em uma escola de música onde eu trabalhava. Contrataram um coordenador pedagógico. Ele avaliava a forma como os professores davam aula, como era a comunicação deles e tudo mais. É um cargo em que você precisa lidar com outras pessoas, você precisa que elas confiem em você.

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Para um professor pedir uma orientação para um coordenador pedagógico, ele precisa se abrir, contar situações que acontecem na sala de aula. Tem que desenvolver certa intimidade. Só que esse coordenador pegava essa intimidade conquistada e usava para cantar as mulheres da escola. Ficava dando em cima de todo mundo. Sabe aquela coisa, se colar, colou? Parecia que ele estava sendo simpático e, de repente, ele estava te envolvendo numa situação constrangedora.

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Ele começou a fazer isso com várias mulheres lá e, claro, todos têm a liberdade de aceitar um cortejo ou não. Mas penso que ambiente de trabalho não é o melhor lugar para fazer isso. Um dia, na porta da escola, ele me cantou, me chamando para ir para a casa dele.

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Eu fiquei muito brava, a ponto de colocar dedo na cara dele e responder: ‘Ponha-se no seu lugar e me respeite, você aqui fora não é meu chefe. Também não é meu amigo! Então, ou você conversa de trabalho comigo ou pode sair de perto de mim’. Nesse momento, dois professores estavam saindo da escola e viram tudo. O coordenador ficou muito assustado, acho que não esperava a reação que eu tive. Ele não falou nada e eu virei as costas.

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A partir daí, ele só me cumprimentava. Ele deve ter ficado mais receoso, porque eu tinha testemunhas. Temos de reagir, mas tem que saber como reagir. Xingar não resolve e pode despertar mais agressividade.

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Eu aprendi isso quando era adolescente e fui cantada por pedreiros, ao passar em frente a uma obra. Eu os xinguei e um deles me bateu –levei sete pontos na cabeça. Por isso, temos que ter coragem de enfrentar, mas com cuidado, prevendo as consequências. Infelizmente, precisa de equilíbrio e sabedoria até para contra-atacar esses homens.”

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(Lorena Aguiar do Amaral, 33, cantora)

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“O presidente pediu que eu readequasse minha postura de feminista e eu recusei o trabalho”

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Arquivo pessoal
 Imagem: Arquivo pessoal

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“Recentemente eu tive uma proposta de uma empresa para trabalhar no desenvolvimento pessoal da equipe de vendedores – a maioria é mulher. Dei duas aulas para a equipe e começou um burburinho entre os colaboradores evangélicos radicais. Eles mandaram os links e prints das minhas redes sociais para o presidente e questionaram se eu era a pessoa certa para o cargo, por ser feminista.

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O presidente, então, entrou em contato comigo e pediu que eu fizesse uma ‘readequação de postura’, para continuar trabalhando com eles e manter o meu contrato. Quer dizer, eu fui chamada exatamente para trabalhar com as mulheres vendedoras a independência emocional delas, mas eu não poderia ser tão a favor da liberdade assim.

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Diante disso, eu mandei um e-mail para eles dizendo que não abriria mão da minha forma de lidar com a vida, dos meus valores, mesmo que isso fosse atrapalhar e finalizar o contrato. Eu não aceito ser colocada em uma caixinha. E esta foi nossa última conversa, eles não me chamaram mais para conversar.

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Eu teria o maior prazer de atender a demanda da empresa desde que isso não tivesse que mudar quem eu sou. Temos que nos posicionar. Eu nunca briguei, porque não é o meu estilo de atuar. Eu prezo o diálogo, até porque eu entendo que cada pessoa cria o seu universo particular na mente. E não é eu batendo de frente que vou abrir esse universo. Mas sempre vou reagir quando essas coisas acontecerem.

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Então, antes de se entregar aos questionamentos ‘o que vão pensar de mim?’, ‘o que vão falar de mim?’, ‘se eu fizer isso, o que vai acontecer?’, lembre-se que nós podemos ocupar o nosso espaço e nós temos voz.”

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(Bárbara Hannelore, 35, coach de desenvolvimento pessoal)

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“‘Se você quer elogiar, elogia a minha inteligência’, falei”

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Arquivo pessoal
 Imagem: Arquivo pessoal

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“Em um escritório de advocacia que trabalhei, o coordenador me deixava constrangida por falar da minha aparência. Uma vez, eu estava saindo do banheiro, e ele estava na porta e falou: ‘Você é muito bonita, hein. Se você fosse menos marrentinha teria uma vida mais fácil aqui dentro’. Aquele dia eu usava um vestido e fiquei muito envergonhada com a situação. Voltei para a sala correndo.

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Um tempo depois, outro advogado pediu que eu conseguisse um papel no fórum e eu respondi que sem uma procuração específica era difícil. Então, o coordenador, no meio de todo mundo, falou: ‘Ah, mas a Isabela, com esse sorriso que ela tem, ela consegue qualquer coisa, todo mundo sabe’. Nesse momento, muito irritada, retruquei, disse que aquilo era assédio. Ele falou ‘está dizendo que eu estou te assediando?’, respondi que ‘sim, eu estou falando que você está me assediando e não é a primeira vez! Você vem me assediando com gracinhas sobre a minha aparência física. Como advogado, você deveria saber que isso é assédio. Eu não vou tolerar esse tipo de postura’.

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Aí ele reclamou que não podia nem mais fazer um elogio, eu disse que aquilo não era elogio. E se ele queria elogiar, elogiasse a minha capacidade por ter estudado direito por quase dez anos e ter feito faculdade, pós-graduação e mestrado. ‘Se você quer elogiar, elogia a minha inteligência’, falei. As pessoas ficaram bem assustadas com a cena, até porque, na equipe, a maioria era mulher, então, elas ficaram olhando do tipo, ‘ela teve coragem de falar?’.

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Na época, eu tinha quatro estagiárias mulheres e isso também me motivou. Elas tinham de saber que poderiam ter uma carreira, estar no mercado sem precisar aceitar esse tipo de ‘piadinha’, que não é engraçada, é assédio. Permaneci na empresa por mais um mês depois do ocorrido e foi bem ruim, porque ele passou a não me dirigir mais a palavra.

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Pedi demissão porque, naquele momento, eu poderia sair do escritório e tocar minha carreira de forma autônoma, como eu acho que deve ser. Mas se eu não tivesse condições, eu teria que me submeter a ser coordenada por essa pessoa.

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Ainda assim, eu acho importante denunciar e, principalmente, defender outras mulheres dentro da empresa. Temos que nos proteger. Porque se a pessoa assediada que reage fica sozinha, ela tem grandes chances de acabar sendo punida com tratamento ainda mais constrangedor ou isolada. Hoje, eu estou trabalhando em parceria com um escritório com quatro homens e sempre que existe uma relação machista eu aponto. E assim construímos um ambiente saudável.”

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(Isabela Blanco Pamplona, 29, advogada)

 

 

 

 

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