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Como chegamos ao primeiro Carnaval sem assédio no Brasil?

Saiu no site REVISTA MARIE CLAIRE

 

Veja publicação original: Como chegamos ao primeiro Carnaval sem assédio no Brasil?

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Antonia Pellegrino fala da evolução do movimento feminista desde 2013 e analisa os passos que nos levaram a ter o primeiro Carnaval em que o assédio é crime no Brasil

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É uma conquista feminista. Desculpa aí se você não gosta da palavra, se você é antifeminista, se você acha que feminista só fica com o peito de fora na rua. Não é isso que a gente faz: a gente luta por direitos. E o primeiro carnaval sem assédio no Brasil é um legado dos movimentos de mulheres para todas, todos e todes.

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Dez anos atrás, ninguém falava: eu fui assediada. Não é que o assédio surgiu de ontem pra hoje. O assédio sempre aconteceu, a diferença é que antes, ele não tinha nome e não era visto como o que de fato é: crime.

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O detonante desta história é a campanha Chega de Fiu-fiu, feita pelo coletivo Think Olga, em 2013. Até ali, o assédio era tão normal, que era preciso gritar que mesmo a mais leve forma de assédio não seria tolerada. Aposto que se a campanha se chamasse Chega de Mão na Bunda, nada do que aconteceu depois, aconteceria. Às vezes a gente precisa chutar a porta pra ter lugar na mesa.

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Mas foi na noite de 20 de outubro de 2015 que a palavra assédio entrou de vez pro vocabulário das violências contra mulher, somando-se a uma longa lista que inclui violência psicológica, porrada, estupro, pedofilia, feminicídio etc. Era a noite de estreia da sexta temporada do Masterchef Junior e uma menina de 13 anos virou alvo de tuítes pedófilos. A mesma turma criadora do chega de fiu-fiu lançou a hashtag #MeuPrimeiroAssédio. E a rede foi inundada por depoimentos de violência.

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Até ali a gente sabia que assédio era comum. Mas ninguém tinha ideia de que era tão comum assim. Ao lerem os relatos, muitas mulheres se deram conta de coisas que elas tinham vivido eram violência. E cada vez mais mulheres puderam dizer: eu já fui assediada.

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A partir de 2016, coletivos feministas entraram na campanha #CarnavalSemAssédio. Pela primeira vez, tatuagens de “não é não” carimbavam corpos das foliãs pra dizer o óbvio em um país onde, segundo pesquisa do instituto Data Popular, 61% dos homens afirmam que uma mulher solteira que vai pular Carnaval não pode reclamar de ser cantada; 49% disseram que bloco de Carnaval não é lugar para mulher “direita”; e 56% consideram que mulheres que usam aplicativos de relacionamento não querem nada sério.

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Um próximo ponto de virada na luta antiassédio foi feito em 2017, quando a figurinista Su Tonani disse ao mundo: “José Mayer me assediou”. O texto, publicado no blog #AgoraÉQueSãoElas – do qual sou editora – pautou o país e fez o debate sobre assédio sair das bolhas progressistas.

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Muita gente duvidou da vítima, acharam que era vingança, que eles tinham tido um caso. O ator se desculpou através de carta lida no Jornal Nacional. E meses depois explodiu o #MeToo. E aí quem ainda não tinha entendido o que era assédio, que envolve relações de poder, e que é crime, entendeu. E passou a ter medo.

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Provoquei o setor audiovisual a fazer uma cartilha anti-assédio, as grandes produtoras provocaram as entidades e instituições. Resultado: rolou. Até que, meses depois, à luz do caso da gozada na cara de uma mulher em um ônibus em São Paulo, veio o clímax desta história: foi sancionada a lei que tipifica o crime de assédio.

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No início de 2019, depois de dois anos na geladeira, Zé Mayer foi demitido da Rede Globo, porque apesar da histórica parceria com o ator, a empresa quis se distanciar da imagem negativa que o Brasil hoje tem do assédio – e do próprio Mayer.

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Um novo capítulo começa agora, no primeiro carnaval sem assédio do Brasil. Parabéns a todas envolvidas na construção deste novo normal.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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