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“Até meu último segundo de vida terei esperança de enterrar minha filha Eliza Samúdio”

Saiu no site REVISTA MARIE CLAIRE

 

Veja publicação original:    “Até meu último segundo de vida terei esperança de enterrar minha filha Eliza Samúdio”

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Sônia de Fátima Marcelo da Silva Moura, de 53 anos, faz um relato emocionante sobre a perda de sua filha, Eliza Samúdio, e sobre a criação do neto Bruninho, de 8 anos, fruto do relacionamento com o ex-goleiro Bruno Fernandes, que atuava pelo Flamengo até 2010. A dona de casa sofre até hoje com a falta de notícias do corpo da jovem que foi dada como morta após um longo período de investigações. Depois disso, conseguiu na Justiça a guarda do menino que tinha apenas 4 meses de vida

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Bruninho, aos 8 anos, tem uma personalidade bem forte e, geralmente gosta de brincar com o videogame, fica no celular jogando ou assistindo alguns vídeos que ele gosta. Ele me chama de ‘mãe Soninha’, mas a iniciativa de me chamar de mãe foi dele. Desde pequeno, eu sempre mostrei fotos da mãe dizendo ‘esta é a mamãe Eliza’ e, até hoje, eu refiro a mim como avó apesar de ele me chamar de mãe. Acredito que isso seja da natureza do ser humano falar mãe e pai antes de dizer vó ou tia. Eu sempre falei pra ele que a mãe Eliza está morando com o Papai do Céu e que virou uma estrelinha.

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Eu sempre contei a ele sobre as coisas que ela gostava de fazer e alguns gestos dele ou modo de olhar lembram muito ela. Eu sempre falei que a mãe dele era uma menina carinhosa, que gostava de jogar bola, alegre, com boas amizades, muito companheira… Muitas vezes ele queria detalhes como o que ela gostava de comer. Ele adora comer batata frita com ketchup como a mãe. Quando vi essa cena, meus olhos encheram de lágrimas.

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– O que foi, mãe Soninha?

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– Nada. Você está fazendo como sua mãe Eliza. Ela adorava comer batata frita assim.

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Tem coisas que a mãe adorava fazer quando criança que ela gosta das mesmas coisas e isso me remete àquela época. Ele tem um gênio teimoso, forte, determinado, meio mandão, mas com carinho e amor, tem boas conversas e a gente consegue chegar num eixo. Sempre disse que a mãe era obediente, eu a colocava sentada em algum lugar sentada dizendo ‘Eliza, fiquei aqui’ e ela respeitava.

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– A vó nunca precisou deixa-la de castigo e sempre foi uma menina muito boa.

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Bruninho se encanta com as fotos da mãe e sempre pede para ficar admirando-as (Foto: Arquivo pessoal)

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O crime

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Ele sabe que a mãe foi morta, que não existe um corpo da Eliza, que os assassinos sumiram com o corpo dela, mas ele não sabe dos detalhes. Acho que ele é muito novo para uma carga pesada como essa. Ele sabe que o pai dele é o responsável, que é mandante do crime. Ao que me parece, o Bruninho não ficou chocado com essa informação porque já vínhamos trabalhando isso há cerca de dois anos, quando ele começou a perguntar do pai.

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– Por que eu não posso conhecê-lo?
– Porque ele foi preso.
– Foi por causa de roubo ou drogas?
– Não.
– Ele matou alguém?
– Não, ele foi responsável pela morte de uma pessoa.

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Em maio do ano passado, ele me questionou como a mãe tinha morrido, eu devolvi a pergunta ‘o que você acha que aconteceu?’ e ele respondeu ‘acho que meu pai é responsável pela morte da minha mãe’. Eu falei ‘então vamos conversar’. Quis saber se alguém tinha contado alguma coisa, mas ele disse que não. Então meu neto percebeu que eu não gostava de ouvir a respeito nem de ver as entrevistas do pai dele. Também não o deixava ver. Ele começou a tirar suas próprias conclusões e eu confirmei que sim.

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– Quem é a outra pessoa que meu pai tentou tirar a vida?

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Eu já tinha dito que o pai tinha feito isso duas vezes.

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– Você, respondi.

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Ele ficou em silêncio, espantado.

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– Mãe Soninha, eu era um bebê!

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As lágrimas vieram [Sônia faz uma pausa para chorar]. É doloroso até hoje tocar neste assunto, mas ele me falou:

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– Não sofra. Não quero te fazer sofrer.

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– Você não me faz sofrer. É você que acalma o meu coração hoje em dia e é por você que eu luto. A dor é muito grande’.

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Desculpa. [Sônia para o depoimento para chorar]

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Sônia mostra o neto, Bruninho, que hoje está com 1,47 m: O médico disse que ele vai passar dos 2 m (Foto: Arquivo pessoal)

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O pai

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Quando o Bruno pediu progressão de regime no ano passado, eu fiquei triste, sabe? Indignada não com a Justiça, mas com nossas leis porque isso está previsto lá. Todo preso tem este direito. É doloroso saber que uma pessoa matou sua filha, sumiu com o corpo e você não tem o corpo dela… Não sei se um dia eu vou ter. Eu fico muito indignada com as leis do nosso país.

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Eu tenho medo que ele venha procurar o Bruninho e, por isso, levo ele na escola, busco e tomo todos os cuidados. Sempre ando por ruas alternativas, nunca pelo mesmo caminho. Médicos e psicólogos que ele frequenta sempre sou eu quem levo. Deixei de trabalhar para viver para ele.

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Meu neto sabe que existe a possibilidade de uma futura batalha judicial pela guarda dele. Sei que sou um peixinho pequeno e o Bruno é um tubarão, mas eu faço qualquer coisa pelo meu neto e vou até às últimas instâncias, sempre dentro da lei. Não faço alienação parental, pelo contrário: sempre digo que ele tem de orar pelo pai para que Deus tenha misericórdia e que, um dia, ele possa se arrepender do que fez, mostrando com gestos, atitudes. Acredito que se meu neto estiver comigo, eu vou ter forças para uma batalha judicial contra ele sim.

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Graças a Deus, eu não passei necessidade financeira ou dificuldade. Às vezes passamos por um aperto ou outro, mas isso é normal na vida de qualquer um. Não recebo nenhum tipo de ajuda do pai e o sustento da minha família vem do meu marido. Esses tempos atrás, eu estava fazendo salgados, mas parei. Às vezes acho que vale mais a pena me dedicar ao Bruninho e poder ficar de olho nele.

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Eliza

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Até o último segundo de minha vida ainda terei esperanças de poder enterrar minha filha. Tenho orado muito a Deus para que o coração dessas pessoas que tiveram envolvimento no crime possam, um dia, dar um telefonema ou dizer que o corpo não existe mais. [Sônia chora] Eu tenho esperanças sim. É um desejo muito grande no meu coração de poder enterrar minha filha. O Bruninho veio até mim em maio, perto do Dia das Mães, e me perguntou onde que a mãe dele estava enterrada. Eu falei que não sabia. Sumiram com o corpo dela. Eu mereço ter uma resposta. Meu neto também merece saber o que foi feito.

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Lidar com a dor é algo difícil. No meu dia a dia, procuro ao máximo ocupar meu tempo fazendo algum serviço para não ficar pensando na dor. Durante a noite é um momento muito difícil. É aquele momento de reflexão e oração e, muitas vezes, demoro para pegar no sono, durmo pelo cansaço, choro sempre quando vêm as lembranças dela. O Bruninho gosta de ter fotos dela espalhadas pela casa, inclusive tem uma ao lado do computador, em cima da geladeira e em cima do armário. É difícil. Às vezes vejo um gesto do meu neto e me remete a alguma lembrança dela. Dizer que a dor passa com o decorrer do tempo não é verdade. Você aprende a conviver. É uma ferida aberta. Contar tudo isso dói. É com uma ferida aberta que sangra quando é tocada.

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Eu tenho muita foto dela. Eu gosto de lembrar da minha menina com aquele sorriso que ela sempre tinha, brincalhona, sarrista… Bruninho tem muito disso, igual a ela. Faz muita brincadeira. As melhores lembranças da minha filha eu carrego comigo, sabe, porque a imprensa denegria a imagem da minha filha em favor do Bruno. As coisas que falaram dela ainda me machucam muito. O lado mãe, o lado mulher, quem conhecia era eu. Ela não era uma vagabunda.

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A Eliza nunca me contou o que acontecia entre ela e o Bruno. O meu relacionamento com o pai dela era parecido com o que ela vivia com Bruno: eu sofria violência doméstica. Uma vez quase perdi o olho direito porque levei um soco e ficou muito inchado, então tive ameaças de morte, mas minha história foi diferente porque eu fugi. A Eliza teve força, teve garra de lutar pelo filho, pelos direitos dele, pelo que ela acreditava ser certo.

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A minha filha foi muito pré-julgada pelas pessoas que acompanharam os noticiários pelo fato do Bruno ser goleiro do Flamengo, sabe? Ninguém quis saber se ela tinha mãe, irmão, acreditaram nas fake news que diziam que eu tinha abandonado minha filha aos 4 meses, coisas que não são verdadeiras. Distorceram a imagem dela o máximo que puderam. O Bruno fez isso como forma de usar em sua defesa. A minha filha passou de vítima a ré. Eu fui pré-julgada, humilhada muitas vezes. Diziam ‘que mãe é essa que abandonou a filha?’, falavam que eu estava interessada no dinheiro do Bruno, que eu era uma mercenária, mas ninguém nunca veio na minha casa para ver como eu vivo, do modo como meu neto é tratado e criado. Só sabiam julgar.

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Nessa história toda, quem mais perdeu foi meu neto. Ele perdeu uma vida inteira com a mãe [Sônia chora]. A Eliza estava vivendo o melhor momento de sua vida, que era a maternidade. Tiraram a vida dela aos 25 anos. Tinha acabado de realizar o sonho de ser mãe e não pode levar a frente, nem vê-lo crescer… Quando eu vou à escola nas homenagens de Dia das Mães, me dói pensar que era pra ser pra minha filha e não pra mim. Eu me pergunto até hoje ‘Por que essas pessoas (se é que posso chama-las assim) fizeram isso? Tudo por causa de dinheiro?’. É difícil falar… [Sônia pausa mais uma vez o depoimento para chorar]

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Eu só gostaria de pedir o corpo da minha filha e um pouco de paz para poder criar o meu neto. A única coisa que eu quero é criar meu neto e que ele seja meu companheiro para que eu possa vê-lo crescer, ser um homem digno.”

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Eliza Samúdio com o pequeno Bruninho no colo, aos 2 meses (Foto: Arquivo pessoal)

Eliza Samúdio com o pequeno Bruninho no colo, aos 2 meses (Foto: Arquivo pessoal)

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.Sônia cuida do neto desde os 4 meses de idade (Foto: Arquivo pessoal)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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